terça-feira, fevereiro 03, 2009

agnaldo timóteo versus a imprensa

n'"o pasquim" 177, semana 21-27 de novembro de 1972, entrevista com agnaldo timóteo:

"MILLÔR - Mas de qualquer maneira você ficou com a impressão...

AGNALDO - Impressão, não, é verdade. Você sabe que tem muita gente na imprensa que toma grana.

MILLÔR - Eu não tenho nenhuma simpatia pela imprensa, não. Acho que boa parte da imprensa é isso mesmo.

AGNALDO - Infelizmente a gente não pode falar porque não tem jeito de provar. Mas tem muito nego tomador de grana, tem, porque tem um cara aí, que escreve pra jornal, que uma vez eu telefonei para uma boate com o nome dele, fui lá e apanhei 10 contos!

ZIRALDO - Quem? Quem?

AGNALDO - Eu não vou falar o nome. Mas que tem, tem... (...)

JULIO HUNGRIA - Você levou uma tremenda vaia, uma coisa assim, como foi isso? Foi no Som Livre?

AGNALDO - É o tal negócio que vocês são responsáveis, são os culpados. Porque se vocês - estou generalizando toda a imprensa - escrevessem que eu era sensacional, aqueles estúpidos, idiotas, acreditariam que eu sou sensacional, porque aqueles animais, boçais, acreditam em tudo que se escreve. Basta dizer que o cara é bom que os otários logo acreditam. (...) Então me vaiaram, mas não vaiaram o cantor Agnaldo Timóteo, mas a pessoa de Agnaldo Timóteo, porque a pessoa é mostrada a eles como cantor de categoria inferior.

JAGUAR - Agnaldo, e qual foi a sua reação à vaia?

AGNALDO - A primeira reação foi mandar todo mundo à p.q.p.! Mas como o programa era televisionado eu não poderia fazer aquilo. Fui lá pra trás, fiquei revoltado, chorei pra caramba! E deu vontade de matar um lá. Aí a Elis Regina veio e me levou pro palco outra vez e tal. E, o pior de tudo é que eu não cantei uma música do meu repertório, cantei uma música do Roberto Carlos. É isso aí.

(...) As pessoas analisam o nosso trabalho, às vezes nem ouvem, pelo título da música, ou pelo autor da música. Eles não gostam do autor e falam mal da gente. A Wanderléa, antes de pertencer à panela da imprensa, eles metiam o cacete nela, ela vivia entrando no pau. O Erasmo, coitado, esse aí eles pintavam com ele. Então o que acontece hoje: a Wanderléa grava um disco e todo mundo diz que está bom [nota do pedro: 1972 foi quando wanderléa foi contratada pela philips, pelo andré midani, e lançou o disco "maravilhosa"], porque ela conseguiu a penetração da imprensa. Quase sempre um grande número de jornalistas especializados não são honestos, são hipócritas e mentirosos".

duas questões aí:

a) aquela em que tenho sempre insistido, seria mesmo estética/artística/musical a discordância de "certos setores" com os artistas "populares"? no que diz respeito a agnaldo timóteo em 1972, a desavença era explícita e transparente, sem meias palavras. e era, ao que tudo indica, recíproca.

b) e se cotejássemos aquela entrevista do agnaldo, 36 anos atrás, com um comentário publicado hoje, 3 de fevereiro de 2009, por luis nassif (que, a propósito, também é músico), em contexto e tempo totalmente diferentes, ou totalmente iguais? repara só:

"A grande frente contra a ditadura ocultou a enorme dose de preconceito e de miopia existente em parte influente dessa elite - a que tem na grande mídia seu porta-voz por excelência.

As invectivas contra a Bolsa Família, contra os gastos sociais, a tentativa permanente de criminalização de todo movimento social, o preconceito contra toda forma de conhecimento não formal, a ascensão dessa direita inculta, truculenta e preconceituosa - reforçando os preconceitos da parte inculta e truculenta da esquerda - torna esse caminho difícil".

pois todo mundo sabe que agnaldo timóteo era preconceituoso e ignorante (e truculento) - tentando se redimir de tomates tacados por ele em caetanos, chicos, jobins e quetais, o próprio agnaldo afirma isso em bilhete escrito em 2008 e publicado como apêndice à entrevista reproduzida na nova edição do livro "o som do pasquim".

mas e quanto ao preconceito, à ignorância e à truculência d'"o pasquim" de 1972, do jornalismo de 2009, "dessa elite" a que se refere o comentário de nassif? por que tanto tabu, tanto pejo, tanto constrangimento, tanta resistência, tanta atrofia em apontar a luz do reflexo do espelho para o outro lado da moeda? pimenta no olho alheio é ki-suco?