sexta-feira, setembro 25, 2009

...e as bruxas, elas existem?

Está no ar, nas bancas de jornal e também no site da Cult, minha terceira coluna na revista. Agora está aqui também.


As bruxas, elas existem ou não?


O percurso acidentado de mulheres que, num ambiente governado por homens, ousaram ser compositoras de MPB

Pedro Alexandre Sanches


Você sabe por onde andam Tuca, Lilian Knapp, Martinha, Elizabeth, Marília Medalha, Rosinha de Valença, Sueli Costa, Luli, Lucina, Anastácia, Dora Lopes, Geovana, Aparecida? Ou, antes, você sabe quem foram, são e serão essas pessoas?
Eram, são e serão artistas bastante diferentes umas das outras. Mas guardavam em comum o fato de terem sido mulheres de atuação febril nos anos 1960 e 1970, quando vigorava uma ditadura militar no Brasil. E também o fato de que eram, são e serão, todas, compositoras por profissão.

Trata-se de um clichê, mas talvez seja necessário repeti-lo: em grande parte de seu percurso, a composição brasileira foi uma atividade avassaladoramente masculina. Na aurora do que hoje chamamos música popular brasileira, existiu a pioneiríssima Chiquinha Gonzaga, em atividade a partir de 1877. Depois disso, apenas na década de 1950 elas viriam a público, nas figuras quase solitárias de Dolores Duran, Maysa, Dora Lopes.

E pronto. Dolores compôs standards da dor de cotovelo, como "Castigo" e "Fim de Caso", e morreu de infarto no auge da inventividade, em 1959, aos 29 anos. Maysa principiou muito jovem, no pique da fossa de "Meu Mundo Caiu" e "Tarde Triste", mas se tornara compositora bissexta quando morreu num acidente automobilístico, em 1977, aos 30 anos.

Atuante desde o fim dos anos 1940 e autodefinida "branca por fora, mas crioula por dentro", Dora elegeu o samba como via de expressão e conquistou picos de sucesso como compositora na década de 1970. Morreu esquecida aos 62 anos, em 1983, nove anos após lançar um LP chamado Testamento, que começava por "Se Eu Morrer Amanhã", "Tá Tudo Certo" e acabava "Com Dolores no Céu".

Ironicamente, foi em tempos de enorme repressão que as mulheres conquistaram avanço numérico e vicejou o elenco citado no primeiro parágrafo. A abre-alas da nova leva se chamava Tuca, cuja primeira composição gravada apareceu no LP Ana Lucia Canta Triste, em 1964. Escrita em parceria com a futura dramaturga Consuelo de Castro, a canção se chamava, veja só, "Homem de Verdade".

Tuca participou da avalanche dos festivais da canção, lançou dois LPs autorais em 1965 e 1968, radicou-se em Paris, voltou ao Brasil em 1975 e morreu em 1978, aos 34 anos, de parada cardíaca decorrente de uma série de dietas para emagrecer.


Geração seguinte

Foi no núcleo da "alienada" jovem guarda que apareceram as próximas cantoras-compositoras. Lilian Knapp coassinou vários dos iê-iê-iês lançados pela dupla Leno & Lilian e fez sucesso solo em 1979, como a bonequinha de "Eu Sou Rebelde" (essa versão não foi escrita por ela, mas por um tal Paulo Coelho). Em 2008, Lilian lançou o CD Underground à frente da banda Kynna, com repertório escrito por roqueiros das novas gerações.

Dona do hit "Sou Louca por Você", Elizabeth lançou uma série de LPs derramados e extrovertidos ao longo dos anos 1970, mas depois desapareceu das gravadoras.

Propensa à fossa, Martinha é caso raro, de autora jovem-guardista bem-sucedida em criar um repertório extenso e sustentável. Foi uma das maiores arrecadadoras de direitos autorais dos anos 1980 e 1990, mas a partir do bastidor, como fornecedora de temas para duplas sertanejas.

De volta ao terreno MPB, Marília Medalha é nobre filha da era dos festivais. Ao lado de Edu Lobo, venceu em 1967 com "Ponteio". Com Tom Zé, conquistou o primeiro lugar de 1968 para "São Paulo, Meu Amor". Só no início dos anos 1970 libertou o lado autoral, em dupla com um certo Vinicius de Moraes.

"Já fui muito prejudicada, tenho uma história de muita surra", me disse numa entrevista em 2006. Fortemente envolvida na resistência à ditadura, parou de gravar em 1992. Em 2008, a jovem cantora Iris Salvagnini lançou de modo independente o CD Iris e a Canção de Marília Medalha, só com composições inéditas da homenageada.

Rosinha de Valença impôs-se por volta de 1964 como exímia violonista na tradição recém-fundada por Baden Powell. Só em 1976 aventurou-se a compor e cantar um disco inteiro, o extraordinário Bicho do Mato. Nos anos 1990, Rosinha teve uma parada cardíaca e permaneceu em coma durante 12 anos, até morrer em 2004. Meses depois, foi honrada com o tributo Namorando a Rosa, dirigido pela ex-parceira Maria Bethânia.

Luli e Lucina fizeram história na invenção da androginia popular brasileira, compondo para o grupo Secos & Molhados (Luli é coautora de "O Vira" e "Fala") e, a seguir, para a fase solo de Ney Matogrosso ("Bandolero" é das duas). Mais tarde se consolidaram como dupla emepebista e hoje compõem e gravam separadas, e modestamente.

A partir de 1971, Sueli Costa compôs hits tristíssimos para Bethânia ("Assombrações"), Elis Regina ("20 Anos Blue") e Simone ("Jura Secreta"). Desde 1975, lança esporádicos e modestos discos próprios, o mais recente deles, Amor Blue, há dois anos. "É, acho que estava um pouco isolada nessa época. Só tinha a Joyce", me disse em 2007, referindo-se a uma das duas únicas autoras daquela geração a levar carreira longeva e comercialmente vitoriosa. A outra era roqueira menina em território arrendado e governado por homens, e se chama Rita Lee.

Do samba brotaram as impactantes cantoras-compositoras Aparecida e Geovana. Do forró é Anastácia, autora (com Dominguinhos) do clássico "Eu Só Quero um Xodó". Compositoras de um nome só, andam perdidas em ruidosa multidão - o recurso de "dar um Google" não é suficiente para localizá-las entre muitas Anastácias, Aparecidas e Giovanas (por esse motivo, aliás, Joyce mudou recentemente sua assinatura para Joyce Moreno).

Parece detalhe prosaico esse do Google, mas será mesmo? Será mera coincidência a subtração dos sobrenomes de tantas Marlenes, Angelas Marias, Inhanas, Morganas, Maysas, Tucas, Elis Reginas, Wanderléas, Waldirenes, Rosemarys, Vanusas, Gianes, Joelmas, Dianas, Martinhas, Silvinhas, Evinhas, Regininhas, Claudias, Márcias, Célias, Joyces, Janes, Miúchas, Marias Alcinas, Alciones, Simones, Joannas, Marinas, Clemildas, Isoldas, Katias, Rosanas, Xuxas, Sandys...?

Repare só nas tantas histórias tristes resumidas acima. Colocadas assim, todas juntas, levam à conclusão de que não só os fazedores de música engajada eram passíveis de castigo, punição e sofrimento. Uma por uma, ajudaram a fixar a mensagem insistente de que, em anos de chumbo, ser mulher e compor música eram condições incompatíveis, se não desastrosas. Não cremos em bruxas, mas... Afinal, somos ou não somos (além de racistas) machistas e patriarcalistas?

domingo, setembro 20, 2009

coisas da vida 2

Coisas do Twitter: Ontem estreei twittar de dentro de um show, o show de Jorge Ben Jor, cá em São Paulo. E o que apareceu na tela foi mais ou menos o seguinte (acrescentarei os acentos que não conseguia na hora, ok?):

@pdralex Ben Jor: uma versão acachapante de Hermes Trismegisto pra começar a animar a festa.

@pdralex Ben Jor: mais maracatu que nunca.

@pdralex Ben Jor tá cantando "Magnólia"!!!!!

@pdralex Ben Jor: versão revigorada de "Os Alquimistas...". Que é que tá acontecendo??!!

@pdralex E logo em seguida "Alcohol", esquece aquele papo datado de passado-presente-futuro.

@pdralex Ben Jor: "Menina Mulher da Pele Preta"!! :-o

@pdralex "Zumbi" em versão reggae. Eu morro!!!

@pdralex Ben Jor: "Do Leme ao Pontal", de Tim Maia!!

@pdralex Ben Jor: ele tá declamando "Cinco Minutos"!!

@pdralex "Jorge da Capadócia" em versão bem Fernanda Abreu, há quantos milênios ele não cantava essa?

@pdralex VOU GRITAR QUE NEM A XUXA: ELE TÁ CANTANDO "o homem da gravata florida"!!!!!

@pdralex Não, ele cantou "Jesualda", eu não vou falar mais nada!


No calor do momento, me apeguei mais às canções de 1974, pelo espanto feliz de ver ele desimplicando do histórico "A Tábua de Esmeralda". Mas foi muito mais que isso, e bastante entremeado com sambas de fases mais recentes e em geral menos admiradas de sua obra - e em releituras invariavelmente inspiradas. O roteiro, se eu não tiver confundido nem esquecido de nada, foi o seguinte:

"Hermes Trismegisto e Sua Celeste Tábua de Esmeralda" (1974)
"A Banda do Zé Pretinho" (1978) + "Salve Simpatia" (1979)
"Por Causa de Você, Menina" (1963)
"Mas Que Nada" (1963)
"Hoje É Dia de Festa" (2004 - ou 2002, na voz de Elza Soares)
"Maria Helena e Chiquinho" (2004)
"Santa Clara Clareou" (1981)
"Zazueira" (1968, na voz de Wilson Simonal)
"A Minha Menina" (1968)
"Que Maravilha" (1969)
"Magnólia" (1974)
"Ive Brussel" (1979)
"Engenho de Dentro" (1993)
"Os Alquimistas Estão Chegando os Alquimistas" (1974)
"Alcohol" (1993)
"Velhos, Flores, Criancinhas e Cachorros" (1975)
"Occulatus Abis" (1979)
"Menina Mulher da Pele Preta" (1974)
"O Telefone Tocou Novamente" (1970)
"Denize Rei" (1978)
"Que Pena" (1969)
"O Dia em Que o Sol Declarou Seu Amor pela Terra" (1981)
"Zumbi" (1974)
"Elizabeth Blue" (1986)
"Bebete Vãobora" (1969)
"País Tropical" (1969)
"Spiro Giro" (1991)
"Do Leme ao Pontal" (1983, de e com Tim Maia)
"W/Brasil (Chama o Síndico)" (1991, com uma introdução que eu não conhecia - seria outra música?)
"Ponta de Lança Africano (Umbarabarauma)" (1976)
"Fio Maravilha" (1972)
"Cinco Minutos" (1974, declamada no meio de "Fio Maravilha")

Bis
"Jorge de Capadócia" (1975)
"O Homem da Gravata Florida" (1974)
"Jesualda" (1975)
"O Namorado da Viúva" (1974)
"Balança Pema" (1963)
"Eu Vou Torcer" (1974)
"Gostosa" (1995)
"Taj Mahal" (1972)
"Dumingaz" (1975)
"A Banda do Zé Pretinho" (1978) + "Salve Simpatia" (1979)

Sentiu o tranco? Cacildis.

coisas da vida 1

Coisas do twitter: Então nossa querida Sandy foi se manifestar no Twitter, sobre a difícil questão da pirataria. Disse ela assim:

@Leah_Sandy É, eu ainda compro CDs, com mto gosto! Não sou de ficar comprando músicas pela web, mto menos baixando... Prefiro esse jeito tradicional!

Aí meu amigo Pedro Noizyman respondeu a ela, mantendo a fórmula "@Leah_Sandy" na equação - para que ela tivesse acesso, é claro:

@noizyman sim, vc é rica RT @Leah_Sandy ainda compro CDs c mto gosto! ñ sou d ficar comprando p web, mto menos baixando. Prefiro o jeito tradicional!

E aí várias pessoas retwittaram a resposta do @noizyman, eu inclusive, e a bobice (dela mesma, ou teleguiada pela indústria de música e comunicação que a sustenta?) da @Leah_Sandy ficou exposta em público pelos 15 minutos (ou segundos) de Warhol.

É, a Sandy pode ser "rica", mas a vida não anda fácil para quem gostava de se manter dentro da bolha isoladora do resto do mundo. Não é de estranhar que a @Leah_Sandy desgoste de downloads, internets etc., e prefira o "jeito tradicional".

quarta-feira, setembro 16, 2009

ié, ié, ié

Então, vamos juntos criticar o "Iê Iê Iê", do Arnaldo Antunes, lá no Twitter? Ainda hoje, quarta 16 de setembro, logo mais, no cercadinho #cricritwitter do @pdralex.

(...)

Pronto, foi, ficou assim:


6 horas antes:

Ê, tem gente manjando da grandeza de @yokoono !!! ♫BETWEEN MY HEAD AND THE SKY ★★★★★ Review in UNCUT Magazine http://bit.ly/Yuncut

e o cara da Uncut diz que em "yes, i'm a witch" (2007), "sim, eu sou uma bruxa", @yokoono se esfregava na cara do "rock misógino". ééééé!

Durante:

Então, vambora, #cricritwitter de "Iê Iê Iê", o novo do Arnaldo Antunes? Quem quiser acompanhar ouvindo, ligo o CD daqui a cinco minutos

Começou. Faixa-título, "Iê Iê Iê".

A primeira coisa que dá para ouvir é o jeitão Fernando Catatau (Cidadão Instigado), produtor do CD.

Sempre acho que os Tribalistas fizeram um bem danado para os três. Para Marisa, para Brown e, principalmente, para Arnaldo.

O exercício constante do AA, daí em diante, em continuar sendo elaborado, sem ser "cabeça", é muito interessante.

Tecladinho do Marcelo Jeneci, não? Mistura de jovem guarda, "Bang Bang" com Nancy Sinatra, tecnobrega paraense...

...E funk carioca, óbvio.

2, "A Casa É Sua". A sonoridade é bem Catatau. E, portanto, bem Chimbinha & Joelma, abaixo as cercas e tabus da MPB!

O estilo Lafayette gritando alto e gostoso nos teclados.

Sensacional o que AA fala no release, de querer revigorar a sonoridade da jovem guarda dos anos 60, mas com linguagem de hoje.

Obs.: não é uma gravadora que lança o disco de AA, e sim uma fábrica de cosméticos. Sinal inquietante do tempo.

3, "O Que Você Quiser". É a quinta vez que ouço o disco, mas essa parece que eu já sei de cor. Surf-rock-jovem guarda delicioso.

E mais tecnobrega... Tem toda uma genalogia aí, né? Chimbinha e vários outros gênios paraenses devem tudo ao iê-iê-iê. E ao Caribe.

RT @gafieiras o arnaldo conseguiu ser ainda mais popular e experimental que os titãs (e nando reis) pós-tribalistas

4, "Vem Cá", também composta pelos 3 tribalistas. Melodia do capeta, entre o melhor que AA já fez, nessa encarnação e nas passadas.

A voz continua uma taquara, mas e daí? Belchior (apareceu?), Moraes Moreira, Fernando Catatau, tantos adoráveis taquaras...

"amar e fazer amor", clichê tipo "amor I love you", mas legal...

5 começa melancólica, é "Longe", parceria com dois moleques da banda, Jeneci e Betão Aguiar (quer dizer, não sei se Betão é moleque...)

Jovem guarda anos 2000: "nenhum e-mail chegou", "não tem satélite transmitindo notícias de onde estou"... Ou tem?...

Gosto muito da melodia dessa "Longe", também.

"Longe" termina com uma contagem regressiva, algo entre "2001" dos Mutantes e "150... 180... 200 km por Hora" de Robertão

O Belchior?! RT @ivanpawlow @pdralex Apareceu. Tá no Uruguai.

A propósito, alguém lembra que Belchior e Arnaldo foram parceiros? No disco "Paraíso" (82), do Belchior. Que é cearense, como Catatau.

6, "Invejoso", parceria com Liminha, sen-sa-cio-nal, em música & letra!

Odair José com letra (um pouquinho) de esquerda...

"in - vejoso/ querer o que é dos outros é o seu gozo", "in - vejoso/ o bem alheio é o seu desgosto"... :-)

inVEJoso me lembra de VEJa, não sei por que...

iê-iê-iê nordestino nervoso (& os calmantes) no final de "Invejoso"

...e um tecnobrega bem caribenho misturado no meio... acho que é a melhor faixa do disco, será?...

Não consigo lembrar quem era o cara iê-iê-iê que cantava um rock sobre inveja, ou algo parecido... Sergio Murilo? Mas SM não era iê-iê-iê...

7, "Envelhecer", parceria com Jeneci e (o pernambucano) Ortinho. não começa muito atraente.

...mas depois a melodia cresce, e a letra produz achados à AA: "eu quero por Rita Pavone no ringtone do meu celular"!

"ser eternamente adolescente, nada é mais demodê", (titãs do) ié ié!

"eu quero (...) que quando eu esquecer meu próprio nome me chamem de velho gagá". Fofo. E profundo.

Um disco contra a (chatérrima) síndrome de Peter Pan do rock'n'roll (de roqueiros e de seus fãs)?

@pdralex e o clipe de "longe" é bem bonito também. http://migre.me/77uV. 6, 5, 4, 3, 2, 1...

8, "Sua Menina", balada suave (e roqueira), mas uma pancada. A "bruxa" @yokoono cantaria facilmente esse rock antimisógino.

E as rimas são um desbunde brega-cafona-calypso-jovem-guardista:

"Você trata muito mal sua princesa/ um dia ela vai virar a mesa"

"Você trata muito mal sua pequena/ um dia ela vai sair de cena"

Tá vendo por que é iê-iê-iê com linguagem moderna? "com certeza ela vai sumir comigo/ vai fugir comigo/ vai sumir comigo sim"

É uma "Namoradinha de um Amigo Meu" sem culpa, né? Um Roberto Carlos (meio) de esquerda...

Tô ouvindo uma Marisa Monte nos vocais de fundo, ou é impressão minha?

9, "Um Kilo" (na capa), ou ou "Um Quilo" (no encarte). Tecnobreguíssimo.

E nordeste-pernambucamíssimo: Del Rey, Mula Manca & A Fabulosa Figura, Academia da Berlinda.

@pdralex eu não sei o que é isso que você está ouvindo, mas essas rimas são de doer! Gongo djá!

"O céu não sai de cima", releitura do RC de "eu te darei o céu, meu bem"?

"Mexerico da Candinha" pansexual às avessas: "se usa camisola camiseta ou camisinha/ também não é da conta da vizinha"

Agora virou guitarrada paraense, Los Pupuña, Pio Lobato etc. Ou Suzana Flag, cadê o Suzana Flag que arrasou no tributo ao Odair José???

10, "Sim ou Não", reminiscências titânicas - parceria com Branco Mello. Afinal, AA foi Titãs que foi Titãs do Iê Iê...

Mais pra new wave que pra funk carioca.

(para) @Crintzs ai, os preconceitos... ... ...

@dafnesampaio a banda chegou por aqui não tem muito tempo. é @bandasuzanaflag

11, "Meu Coração", AA e Ortinho, um quê(zão) de Serge Gainsbourg (a propósito, existe algo mais moderno que Serge Gainsbourg?).

Uma certa cantora (também cearense) uma vez me disse que Wando era o Gainsbourg brasileiro. Espero tanto, até hoje, o Serge Wandsbourg dela

Tinha uma antipreconceito contra a velhice, essa é a antipressa: "Só corre e nunca chega na frente/ se chega é pra dizer 'vou embora'"

A gente sabe muito bem como é isso de chegar só pra dizer "vou embora", né?

(para) @dafnesampaio Sim, eu sigo a @bandasuzanaflag, mas quase nunca ouço eles falarem...

12, "Luz Acesa", a última, mais um reencontro de Titãs: parceria com Marcelo Fromer (deve ser antiga, né?) e Sérgio Britto.

Algo meio ska, meio Paralamas... New wave... Aliás, new wave é um gênero morto, como AA diz no release que o iê-iê-iê é?

Sei não, eu não concordo muito com isso de o iê-iê-iê ser um gênero morto... a Banda Calypso por acaso está morta?

Não tá, e vende disco como água.

Acabou. Resumo da ópera-pop-warhol? Um grande disco, prontofalei.

E, pronto, calei. "Você trata muito mal sua princesa um dia ela vai virar a mesa."

Só mais uma, pra quebrar o clima AA, genial RT @arnaldobranco PUTA MERDA, OURO > Originais do Samba na TV Cultura, 1972 http://migre.me/77Am

+- meia hora depois:

Leoni_a_jatoOnde você viu isso? RT @pdralex: Obs.: não é uma gravadora que lança o disco de AA, e sim uma fábrica de cosméticos.

oonacastro@pdralex muito boa a crítica de Pedro Alexandre Sanches sobre o novo disco do Arnaldo. Muy bueno!

Leoni_a_jatoTambém achei. É incomodamente original. RT @pdralex: Acabou. Resumo da ópera-pop-warhol? Um grande disco, prontofalei.

@Leoni_a_jato É a patrocinadora, Leoni, a Natura...

@oonacastro gracias, Oona!!! e viva os tempos digitais, né?... :-)


Então, foi mais ou menos isso. Arnaldo Antunes, partindo de Yoko Ono e chegando aos Originais do Samba (e a um comenário do Leoni, que sempre soube dar valor ao iê-iê-iê).

sexta-feira, setembro 11, 2009

o sertão que não existe mais

Na "CartaCapital" 562, na data redonda de 9 do 9 do 9.


O sertão que não existe mais

Por Pedro Alexandre Sanches

Manifestações populares espontâneas a Luiz Gonzaga brotaram em diversos pontos do Nordeste neste agosto de 2009. A evocação refere-se aos vinte anos da morte do músico pernambucano, mas possivelmente fazia referência indireta também à morte de um Nordeste que ele cortantemente transformou em canção e que hoje não existe mais.

Em retretas de sanfoneiros como aque la em torno de seu busto em Juazeiro do Norte (CE), no redondo 2 de agosto, cabiam menções ao sertão caatingueiro, às canções sobre seca e abandono político (como Asa Branca, de 1947), às vestes de couro inspiradas nos cangaceiros de Lampião. E cabiam loas à série fabulosa de invenções formuladas pelo “rei” do baião, do xaxado, do xote, do rojão, do coco, da quadrilha, do forró, da música pop tocada com sanfona, zabumba e triângulo (instrumentos antes pertencentes apenas ao folclore local).

Hoje um Nordeste voltado ao progresso se sobrepõe às imagens de “terra ardendo”, “braseiro”, “fornalha” (ou “fornaia”, como ele pronunciava) e “nem um pé de ‘prantação’” de Asa Branca. Há quem se incomode com o status de “hino do Nordeste” adquirido por essa canção, como Lirinha, do grupo Cordel do Fogo Encantado, nascido em cidade vizinha à Exu de Gonzaga e contrário à perpetuação da submissão inscrita em algumas de suas canções. Também costuma ser citado certo apego do patriarca musical a pendores autoritários e conservadores, típicos do coronelismo, como na biografia Vida do Viajante (34, 1996), da francesa Dominique Dreyfus.

São retratos do Nordeste percebido e difundido pelo cantor entre 1912 e 1989, de contraste vívido com o imaginário praiano do outro grande retratista musical daquela região no século passado, o baiano Dorival Caymmi (1914-2008). Aspectos que hoje pareçam anacrônicos em nada arranham o legado colossal da obra registrada por Luiz Gonzaga entre 1941 e 1989, em mais de 150 discos, entre compactos de 78 rpm e LPs (também nisso ele é duplo negativo de Caymmi e suas 101 canções).

A saga épica segue preservada, e o comprova o cineasta Breno Silveira, que prepara, possivelmente para o ano do centenário de Gonzaga, uma versão cinematográfica romanceada sobre a vida do viajante. Foram adquiridos os direitos de uso da biografia Gonzaguinha e Gonzagão – Uma história brasileira (Ediouro, 2006), de Regina Echeverria, centrada na tumultuada relação entre pai e filho adotivo (embora fértil em canções, o artista era biologicamente estéril). Seria sinal de que o diretor do também épico 2 Filhos de Francisco (2005) prepara novo filme fundado no tema da paternidade? “Não necessariamente”, diz a coprodutora Márcia Braga. “Compramos mais para nos precaver de a ideia ser vendida para outra produtora.”

Músico, Gonzaguinha (1945-1991) bateu de frente com Gonzagão ao aderir à chamada “canção de protesto” na virada dos anos 1960 para os 1970. Num mesmo disco (Canaã, de 1968), o pai, getulista e adepto da ditadura, compôs e gravou Canto sem Protesto e abrigou as primeiras composições de Gonzaguinha, entre elas Pobreza por Pobreza (a mão é sempre a mesma que vive a me explorar, diz a letra).

Não só em relação ao filho, submissão e insubordinação se confrontaram em Gonzaga. Segundo Dominique Dreyfus, quando moço ele tinha Lampião como herói, mas perseguiu cangaceiros por obediência. “Eu era empregado do Exército, era soldado. Tinha disciplina. E eu sempre gostei de disciplina”, afirmou à autora.

O mito do cangaceiro ressurgiria em 1947, no Rio, onde o imigrante desenvolveu a maior parte de suas obras-primas de “nordestinidade” (e esse é ponto em comum com Caymmi). Asa Branca iniciava uma rota de sucesso, e Gonzaga abandonou os ternos e gravatas para adotar o chapéu à moda de Lampião como símbolo de identidade nordestina. A Rádio Nacional, dona de seu passe, proibiu a referência ao cangaço, mas engoliu o sapo diante do sucesso do figurino. Em breve ele completaria a estilização de cangaceiro com gibão de couro, cartucheira e sandálias. E seguiria apregoando a imagem de pretenso fora da lei em territórios de suposta legalidade.

A tensão entre a clausura da disciplina e o espírito livre rendeu outras grandes canções sobre passarinhos, Acauã (de Zé Dantas, 1952) e Assum Preto (1950). Nessa, Gonzaga e o futuro deputado cearense Humberto Teixeira despistavam o dilema do pássaro que tem os olhos furados para “cantá mior”: Assum preto véve sorto/ mas num pode avoá/ mil vez a sina de uma gaiola/ desde que o céu, ai, pudesse oiá.

Gonzaga borrou limites entre lei e desordem musical de modo a não fazer feio no século de downloads e copylefts. Vários clássicos assinados por ele, inclusive Asa Branca, pertenciam ao folclore nordestino e ao repertório de seu pai sanfoneiro, Januário. Em depoimento à biógrafa francesa, o músico deu a entender que, em algumas das canções assinadas com Zé Dantas, era mais “sanfonizador” que coautor.

Com o apogeu da era do rádio, avolumava-se a cultura (ou melhor, a economia) dos direitos autorais, e o expropriador viveria dias de expropriado. Em 1949, os norte-americanos Harold Steves e Irving Taylor verteram ao inglês e a cantora Peggy Lee gravou Juazeiro, ou melhor, Wandering Willow, sem crédito a Gonzaga e Teixeira. Processados por plágio, argumentaram que, como os brasileiros, inspiraram-se no folclore. Mas a gravadora teve de recolher os discos das prateleiras.

Criador e mantenedor do site www.luizluagonzaga.mus.br, o bancário pernambucano Paulo Vanderley afirma que as homenagens nordestinas em 2009, em sua maioria, “vêm de baixo para cima”. Num evento oficial de Exu, em 2 de agosto, esteve o governador paulista José Serra. “As informações que circulam por aqui é que ele queria atingir o Nordeste por meio de Luiz Gonzaga”, diz Vanderley.

Para contrapor a noção do músico como retratista da submissão sertaneja, o fã cita Vozes da Seca, de 1953: “Ali ele diz que o nordestino não quer esmola. É muito atual”. A letra dessa parceria com Zé Dantas flagra ambiguidades entre nortistas e sulistas: Seu doutor, os nordestinos têm muita gratidão/ pelo auxílio dos sulistas/ nesta seca do sertão/ mas, doutor, uma esmola/ a um homem que é são/ ou lhe mata de vergonha ou vicia o cidadão. Veja bem, quase a metade do Brasil tá sem comer, arremata.

Inúmeras ambiguidades forjaram a obra e o sucesso maciço de um artista ímpar, e talvez tamanha identificação viesse do dado prosaico de que Gonzaga era tão ambíguo (e estéril) quanto a região e o país em que nascera. Mas e se houvesse férteis sementes de progresso e libertação plantadas na aridez de Asa Branca e nos baiões obedientes com que Luiz Gonzaga ajudou o Brasil a conhecer seu Nordeste?

sexta-feira, setembro 04, 2009

blowin' in the wind, caminhando contra o vento

A segunda coluna na revista "Cult", edição 138, de agosto de 2009.


Caminhando contra o vento, like a rolling stone

A história não costuma ser gentil com os artistas
que optam por fazer da música uma ferramenta de engajamento

Pedro Alexandre Sanches

Em 1965, o norte-americano Bob Dylan apresentou-se ao público do festival de folk de Newport munido de guitarra e eletricidade. Se um ano antes fora recebido no mesmo festival como porta-voz e consciência de uma geração politizada, agora as vaias se abatiam sobre ele enquanto cantava, elétrico, que não queria mais trabalhar na fazenda ("Meggie's farm") e se sentia sem casa, ao desabrigo ("Like a rolling stone"). Para o público que acompanhara a ascensão do jovem cantor, parecia estar em curso uma traição ao folk de protesto que o fizera florescer.

Em 1968, as vaias derrotaram o brasileiro Caetano Veloso no 3º Festival Internacional da Canção Popular (FIC). Como já acontecera no ano anterior com "Alegria alegria", guitarras roqueiras lhe faziam cama, desta vez aos gritos de "eu digo não ao não" ("É proibido proibir"). A hostilidade abafou a canção e culminou num longo diálogo surdo entre as vaias da plateia e o indignado discurso de reação do artista. Nervosíssimo, ele comparou o público estudantil, supostamente de esquerda, aos direitistas espancadores do Comando de Caça aos Comunistas.

Cada um à sua maneira, Dylan e Veloso cresciam artisticamente num curioso estado de guerra contra grande parcela de seus admiradores e/ou consumidores. Jovens saíam das apresentações de Bob aos gritos de "idiota", "falso" e "neurótico" - mas continuavam lotando seus shows.

Em Newport 1965, Dylan teve como inusitado antagonista um de seus antecessores musicais, o cantor e compositor de folk Pete Seeger. Versões desencontradas são unânimes em testemunhar a fúria de Seeger contra Dylan nos bastidores; segundo uma delas, o autor do folk de protesto "If I had a hammer" (1949) tentara eliminar a distorção do som do pupilo com o auxílio de um machado. Na turnê que deu prosseguimento à ruptura de Newport, Dylan conviveu diuturnamente com os apupos da plateia e a animosidade cobradora da imprensa.

No Brasil, a guerra contra as guitarras esquentara um ano antes do episódio de "É proibido proibir". A TV Record preparava um novo programa dedicado à música popular brasileira - ou MPB - que se chamaria Frente única e tinha como principais entusiastas Geraldo Vandré e Elis Regina. Sob a "ameaça" da inconsequência roqueira da jovem guarda, forjou-se um ato público em defesa da MPB, a até hoje célebre "passeata contra as guitarras". Marcharam Elis, Vandré, Chico Buarque, Edu Lobo, Jair Rodrigues e um Gilberto Gil pré-tropicalista. Caetano e Nara Leão recusaram-se a participar e assistiram a distância.

Uma comparação entre a MPB norte-americana e a folk music brasileira poderia apontar para a constatação de que, embora o antiamericanismo fosse questão de honra para os puristas brasileiros, os embates ideológicos e os ânimos exaltados daqui não significaram muito mais que a reprodução de batalhas já travadas ao norte da América. Mas não é exatamente disso que este texto quer tratar. Façamos mais um paralelo.

A herança de Dylan e Caetano

O folk nunca mais foi o mesmo depois de Bob Dylan. Representantes da esquerda na música popular de lá, artistas como Joan Baez (sua parceira e/ou namorada à época), Odetta e Pete Seeger mantiveram-se politicamente ativos, mas encolheram consideravelmente suas presenças no cenário musical. Há pouco, Seeger reapareceu diante de uma gigantesca plateia, trazido pelas mãos do discípulo roqueiro Bruce Springsteen. Juntos, cantaram folks de protesto na cerimônia de posse do democrata Barack Obama.

No Brasil, ao menos três ícones identificados naquele momento com a canção de protesto seguiram adiante a todo vapor: Elis Regina, Chico Buarque, Maria Bethânia. Em tempos próprios e por atalhos diversos, todos aplacaram a veia do protesto, como também fez Nara Leão a partir da adesão transitória à tropicália. Milton Nascimento manteve-se à parte, embora flertasse e continuasse flertando com o protesto e com o folk à brasileira.

Entre os mais afetados pela convulsão tropicalista, há todo um elenco de artistas engajados da era dos festivais: Vandré, Edu Lobo, Marília Medalha, Sidney Miller, MPB 4, Sérgio Ricardo, Taiguara, Tuca, Gonzaguinha, Grupo Manifesto, Maranhão, Cesar Costa Filho... O bravo Sérgio Ricardo, pertencente à linha purista (e acústica), desestruturou-se pelas vaias antes de Caetano: desistiu de seu "Beto bom de bola", chamou os espectadores de "animais" e quebrou o violão no palco, no festival de 1967.

É forçoso reconhecer que a história brasileira não foi gentil com seus cantores mais politizados e ortodoxos (de esquerda): após a síntese tropicalista, sua arte se converteu em antiquada e passou a ser compreendida como fora de moda à luz das novas convenções. Autor do hino "Pra não dizer que não falei de flores" (1968), Vandré renunciou à música, e longe dela se conserva até este momento (ao menos diante do olho público). A morte precoce foi o destino de uma quantidade desconcertante de artistas que passaram pelo protesto: Elis, Nara, Sidney Miller, Taiguara, Tuca, Gonzaguinha, Maranhão...

Se nos Estados Unidos o rolo compressor dos mercados despolitizou a música e deixou à míngua polarizações direita/esquerda, aqui a mensagem foi mais cruel. Por décadas aprendemos a entender que arte engajada era não só "chata", como passível de punição, por vezes à pena capital (com ou sem trocadilho, a gosto do freguês). Sob a rotulação de "panfletários", foram anulados (e se autoanularam) artistas como Sérgio Ricardo, num processo ironicamente semelhante ao que segregou a tal MPB, num centro de poder e prestígio, de sambistas, "cafonas", "alienados", Wilson Simonal & outros marginalizados.

Conclusões erráticas e sujeitas ao erro podem se tirar de tais fábulas. Uma possível é que, da arena sangrenta, saíram vitoriosos homens como Bob Dylan e Caetano Veloso, situados nalgum lugar indeterminado entre os clássicos polos ideológicos, conquistadores da sobrevivência artística e mercadológica, em muitos momentos à custa do enfrentamento frontal com público, crítica e quem mais chegasse. A vaia, no caso deles, foi nutriente crucial para a permanência.