sexta-feira, agosto 31, 2007

mixto quente



abaixo, o texto do pedro noizyman, que chamou para essa brincadeira no domingo paulistano:

"car@s amig@s,

quero mais uma vez convidá-los para o próximo mixtoquente na casadaLapa:

mixtoquente VI> domingo, 2 de setembro de 2007, a partir das 16h00

casadaLapa> laboratório de intenções. contaminador de processos.

endereço> avenida ricardo medina filho 904, travessa da rua tonelero que é
travessa da av. cerro corá na altura do mcdonalds - lapa

shows> solano star (banda de taciana barros e edgar scandurra) + wander wildner
djs> noizyman + will robson + convidado pedro alexandre sanches
cinema> kika nicolela + gero camilo e gustavo machado + danilo solferini
video> bijari + projeto matilha
+ exposição coletiva "onde está o craque?"

é só chegar. vibe positiva. domingão lá em casa. música, cinema, video, artes plásticas, cerveja e diversão.
beijos e até lá,

pedro noizyman".

quinta-feira, agosto 23, 2007

neocoronelismo neo-eletrônico

tema de fundmental importância, na "carta capital" 357, de 15 de agosto de 2007. a reportagem teve valiosa colaboração do colega rodrigo martins. zzzt, zzttt, zzzzztt.

[consultar também o tópico banda larga, se faz favor.]


OS NOVOS CORONÉIS
Ao menos mestade das rádios comunitárias autorizadas no País está sob controle de grupos com vínculos partidários

POR PEDRO ALEXANDRE SANCHES

Há um novo coronelismo eletrônico ganhando força no Brasil. Ele não é mais um monopólio associado a lideranças despóticas no Nordeste nem ligado à expansão da radiodifusão comercial. Espalha-se por todo o País e, apesar de ter alcance regional restrito, abre espaço para uma manipulação política cujos efeitos têm poder de influência em municípios e na configuração do Congresso Nacional.

O foco de interesse dos novos coronéis são as rádios comunitárias, cujas concessões entre 1999 e 2004 somam 2.205. Metade delas foi concedida a grupos que possuem algum tipo de vínculo político-partidário, segundo um estudo desenvolvido pelos pesquisadores Venício A. de Lima e Cristiano Aguiar Lopes, com apoio do Instituto para o Desenvolvimento do Jornalismo (Projor), ligado à Unicamp. E ao menos 5,4% delas possuem vínculos religiosos reconhecíveis. Entre representantes legais e/ou diretores de rádios que a pesquisa pôde identificar, aparecem cerca de 200 cidadãos ligados de algum modo ao PSDB e ao PMDB, e cerca de 150 com vínculos com PFL e PT.

É flagrante o desrespeito à lei, que veta proselitismo político, religioso ou de qualquer espécie em rádios comunitárias que deveriam beneficiar as comunidades onde estão plantadas, num raio máximo de um quilômetro, sem fins lucrativos. "A presença maciça de vínculos políticos e religiosos ocorre em detrimento da representatividade de outros grupos de interesse da sociedade civil organizada. Temos uma política de radiodifusão comunitária que é excludente, não includente", afirma Aguiar Lopes.

Os autores ressaltam que, assim como no caso de rádios comerciais, os resultados são necessariamente subestimados, pois não têm como abranger a prática do uso de "laranjas" para encobrir vínculos com políticos em exercício de mandato.

Na República Velha, estabeleceu-se o coronelismo tradicional, apoiado no voto de cabresto e na interdependência entre "senhores" regionais e o poder central. Nos anos 50 e, depois, durante a ditadura militar, consolidou-se o coronelismo eletrônico, fundado no controle de concessões de rádio e tevê.

Famílias como Sarney, Barbalho, Jereissati, Garibaldi, Collor de Mello, Franco, Alves, Magalhães, Martinez e Paulo Octávio somaram poder político estadual e/ou regional com a propriedade de concessões, em associação com redes nacionais, em especial a Globo.

"Em 40% das cidades brasileiras, são as prefeituras que compram o transmissor e fazem a manutenção das rádios comunitárias, para serem retransmissoras da Globo", afirma José Guilherme Castro, da Associação Brasileira de Radiodifusão Comunitária (Abraço), integrante original de uma das experiências históricas na área, a Rádio Favela de Belo Horizonte.

O que Lima e Aguiar chamam de "coronelismo eletrônico de novo tipo" é o modelo urbano desenvolvido a partir da Constituição de 1988, que concedeu aos municípios maior autonomia e integração como entes federativos, e a partir da lei 9.612, que em 1998 deu existência oficial à radiodifusão comunitária no Brasil.

"Se constatamos que em torno de 70% das outorgas vão atualmente para rádios comunitárias, a conclusão é que elas se transformaram numa manifestação nova de um fenômeno velho. A barganha política hoje é feita diretamente por políticos que atuam localmente, como prefeitos, vereadores, candidatos derrotados, membros de partidos, lideranças políticas locais, financiadores de campanhas eleitorais", descreve Lima.

Na cidade-satélite de Taguatinga (DF), por exemplo , a emissora Ondas da Bênção está alojada num prédio da Igreja Tabernáculo Evangélico de Jesus. Um dos pastores da comunidade é o deputado distrital Rubens Brunelli (ex-PFL), ex-dirigente da entidade que solicitou a outorga, em 1998. A rádio hoje é liderada pelos pais do parlamentar. O coordenador é o pastor Adilson Oliveira, que nega favorecimentos ao deputado. "Não lembro uma única vez em que ele tenha ocupado o microfone. Às vezes aparecem materiais de campanha no estúdio, mas são as pessoas da comunidade que trazem. O deputado é muito querido no bairro." Brunelli prefere não comentar o assunto. Delegou à assessoria de imprensa a tarefa de dizer que "não tem vínculos com a emissora".

"O elo entre os poderes locais, estaduais e federais ainda é muito forte. É uma corrente estrutural e histórica de transmissão de interesses", avalia a cientista política Lúcia Avelar, da Universidade de Brasília. "A gente ainda tem muito trabalho pela frente até que as ligações de natureza particularista e clientelista sejam superadas por outras mais de sociedade civil organizada. Eu diria que, apesar de claros avanços, a prevalência do clientelismo ainda é de uns 70%."

Um estudo de Lúcia Avelar ilustra uma relação direta entre o poder municipal e a formação de bancadas no Congresso Nacional. A conexão explica o fato de o PMDB e o ex-PFL ainda elegerem um grande número de deputados e senadores, apesar da reduzida quantidade de governadores e do fato de que as duas legendas nunca conseguiram lançar candidatos competitivos à Presidência da República desde o fim da ditadura militar.

O PMDB e o ex-PFL comandam a maioria das cidades brasileiras, o que mostra que, quanto maior o poder municipal, maiores são as chances de engordar as bancadas estaduais e federais. Portanto, ter uma rádio, mesmo que de alcance limitado como as comunitárias, pode criar uma preciosa alavanca na carreira política.

As outorgas de funcionamento são concedidas após passarem pelas instâncias do Ministério das Comunicações (MiniCom), Casa Civil, Câmara Federal e Senado. Baseados num banco de dados de pleitos políticos feitos aos anos de 2003 e 2004, obtido no MiniCom, os pesquisadores constataram que, de 1.010 processos apadrinhados por pleito político, 35,34% foram autorizados. Entre os processos sem apadrinhamento reconhecível, a aprovação foi de 8,01%. Em média, para cada processo aprovado cinco são arquivados. Os processos apadrinhados tiveram naquele período 4,41 vezes mais chances de serem outorgados.

O texto da pesquisa assim resume a situação vigente: "É um caso típico de utilização do patrimônio público para se atingir interesses privados. Trata-se, portanto, de um comportamento que remonta ao velho Estado patrimonialista, no qual não havia limite entre o público e o privado e os patrimônios do Estado e do governante terminavam por se misturar".

Os padrões encontrados são semelhantes seja no governo de Fernando Henrique Cardoso (com vínculos políticos verificados em 51,5% das rádios), seja nos dois anos analisados do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (45,5%). Na era FHC, a pesquisa encontra outro tipo de indício de favorecimento político. O estado que teve o maior número de outorgas concedidas é Minas Gerais, domicílio eleitoral do ministro das Comunicações, Pimenta da Veiga. Ele destinou a Minas 19,83% das concessões; a taxa subiu para 22,28% nos nove meses finais do governo FHC, quando o ministro foi substituído por seu secretário-executivo, Juarez Quadros.

No primeiro governo Lula, nas gestões do carioca Miro Teixeira e do cearense Eunício Oliveira, as concessões para Minas Gerais caíram sucessivamente para 16,67% e 9,68%. O Rio de Janeiro ganhou 2,7% das concessões na passagem de Teixeira, e o Ceará, 8,6% na de Oliveira. Não estão disponíveis dados da atual gestão, do ministro Hélio Costa.

Uma das queixas dos pesquisadores, quanto ao MiniCom e ao Palácio do Planalto, é de falta de transparência e agilidade na disponibilização de dados supostamente públicos sobre radiodifusão. Tampouco o pedido de entrevista a CartaCapital foi atendido pelo ministro Hélio Costa.

Outra distorção se dá no tempo de tramitação na Presidência da República, entre a saída do MiniCom e a chegada ao Congresso Nacional para aprovação final. No governo FHC, a demora média foi de 67 dias, com mínimo de quatro e máximo de 758. Nos dois primeiros anos do governo Lula, foi de 334 dias, com mínimo de 20 e máximo de 834. Processos iniciados na era FHC e concluídos na era Lula demoraram 734 dias em média, com mínimo de 146 e máximo de 1.475.

Os autores interpretam que não há burocracia que explique a grande dispersão encontrada. "Os dados demonstram que não há uma fila organizada, sendo concedidos privilégios para alguns e criadas dificuldades para outros", diz o texto.

Distorções e irregularidades são regra também no que diz respeito à radiodifusão comercial. Em 2005, outra pesquisa de Lima constatou que pelo menos 51 dos 513 deputados federais em exercício em 2003 e 2004 eram concessionários diretos de canais de rádio e/ou tevê, o que fere o artigo 54 da Constituição Federal e, de acordo com o artigo 55, implicaria perda de mandato.

Vários dos parlamentares eram integrantes da Comissão de Ciência, Tecnologia, Comunicação e Informática, onde tramitam os processos de outorga e renovação de concessão de canais.

O então presidente da comissão, Corauci Sobrinho (PFL-SP) votou a favor da renovação da concessão de sua própria rádio, a Renascença, de Ribeirão Preto, o que fere o regimento interno da Câmara. Em 2005, o Projor protocolou o levantamento na Procuradoria Geral da República e solicitou a tomada de medidas judiciais e extrajudiciais cabíveis. Com base nos dados, o Ministério Público do Distrito Federal propôs, no mês passado, a anulação das concessões de seis empresas locais de rádio e tevê.

"O quadro das concessões no Brasil é caótico, de absoluto descontrole e desorganização. Só quem tem dinheiro pode concorrer, e isso exclui a massa dos brasileiros", afirma a deputada Luiza Erundina (PSB-SP), atual presidente de uma subcomissão parlamentar que busca reformular o sistema de outorgas e renovações.

"A chegada do sistema digital seria uma oportunidade para revertermos essa concentração fantástica em torno de seis famílias. Estamos lidando com o poder real, o poder da informação, não é pouca coisa. A reforma do ar é mais importante que a reforma agrária. Quando tivermos a democratização da informação, o resto será conseqüência", diz a deputada.

Fora dos arcos de influência política, rádios não legalizadas erguidas por movimentos sociais e comunidades locais enfrentam rotina imposta pela Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) e pela Polícia Federal (PF), de repressão, fechamentos, prisões e condenações (quadro à pág. 14).

"A Anatel e a Polícia Federal, que dizem que cumprem a lei, referendam ilegalidades cometidas pelo Ministério das Comunicações. Acatam aquelas, e vão perseguir as rádios que não têm outorga", critica o jornalista Dioclécio Luz, autor do livro A Arte de Pensar e Fazer Rádios Comunitárias, que distribui junto às próprias comunidades. E exemplifica: "Existe uma entidade chamada Ancarc, Associação Nacional Católica das Rádios Comunitárias, que reúne 200 rádios autorizadas. A lei proíbe isso, se é católica não pode ser comunitária, se é comunitária não pode ser católica".

"O movimento das rádios comunitárias hoje é como uma guerra que não ganhamos nem perdemos", diz José Guilherme Castro, da Abraço. "É um processo que trata a gente como erva daninha, o que nos desestrutura completamente. Somos os iraquianos dessa história."

As queixas contra o comportamento do governo Lula no setor são recorrentes. "É uma situação constrangedora, porque nosso pretenso aliado só nos enrola, há quatro anos e oito meses", afirma Luz.

"Estimamos que houve 15 mil fechamentos de rádios comunitárias e cerca de 5 mil condenados nos últimos cinco anos. Repressão sempre houve, mas o processo de condenações começou no governo Lula", diz Castro. "Há a contravenção das não-autorizadas, fazem ligações entre as comunitárias e o narcotráfico. E nossos próprios companheiros às vezes acreditam mais na Folha e na Veja que na gente."

Mas a Abraço reconhece avanços, apesar da reinvenção do coronelismo eletrônico. "Em oito anos, quase 3 mil rádios comunitárias receberam autorização para funcionar. É uma conquista, se pensarmos que, em 38 anos de existência das rádios FM, menos de 2,8 mil foram autorizadas", afirma Castro. "Não temos nenhum representante no executivo ou no legislativo, somos o lumpesinato. Do outro lado, o 'Partido da Mídia' continua unido. Mesmo assim, as comunitárias mudaram muito a população mais pobre do Brasil. Não há negros comandando os meios de comunicação, mas nas rádios comunitárias há".

Os exemplos são abundantes. Dioclécio Luz cita uma rádio gaúcha dirigida por um pedreiro negro e uma fluminense criada por uma dona-de-casa, esposa de militar, que agora cursa a faculdade de comunicação. "Para muitas pessoas com problemas emocionais e depressão, passaram a ser uma terapia ocupacional sem terapeuta", diz Castro.

Como os militantes interpretam a repressão oficial preferencial sobre aquele microcosmo? "Já ouvi de policiais que é um trabalho que não queriam fazer, que cumprem ordens. As comunitárias são fechadas porque são uma tragédia para as grandes empresas de comunicação", diz Luz.

"A repressão se tornou muito refinada, porque rádio comunitária derruba tubarão, não derruba avião", afirma Castro, numa conexão involuntária entre dois tipos de "caos" aéreo brasileiro.


ENQUANTO ISSO, NAS FMs...
Um levantamento aponta que só 3 das 40 rádios comerciais na cidade de SP têm outorgas válidas

Há um nítido duplo padrão de rigor na fiscalização das rádios no Brasil. A rotina de repressão às emissoras de comunidades carentes é bem expressa no filme Uma Onda no Ar (2002), de Helvécio Ratton, inspirado na experiência da Rádio Favela de Belo Horizonte, que amargou uma década de perseguições antes de ser regularizada como rádio educativa.

A tolerância é infinitamente maior, entretanto, quando se trata de rádios comerciais, como aponta um estudo preliminar conduzido na cidade de São Paulo pela ONG Intervozes. Ao analisar dados públicos da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), os pesquisadores constataram que, das 40 rádios FM em funcionamento na capital, apenas três possuem outorgas válidas.

Ou seja, 92,5% das rádios FM da cidade funcionam irregularmente, várias delas com concessões expiradas desde 1990, como a Tupi. "Sabemos que, em muitos casos, a culpa é do Ministério das Comunicações. Os pedidos de renovação devem ser feitos de três a seis meses antes de a outorga expirar, e a tramitação demora em média seis anos. Mas uma rádio não deve estar com a outorga vencida desde 1990 por questão administrativa. Tem alguma coisa aí", diz João Brant, coordenador da Intervozes.

Outra constatação é de que mais da metade das 40 FMs que irradiam na cidade não possuem concessão na capital, mas em municípios vizinhos. "Há quem tenha autorização para Jundiaí e antena e estúdio na avenida Paulista." O artifício parece ser destinado a driblar a proibição legal da duplicidade de outorga a um concessionário numa mesma localidade. "Mas há grupos que se orgulham de dizer que têm cinco rádios na cidade", diz Brant.

Em meio a essa situação, as verdadeiras comunitárias de São Paulo se preparam para o primeiro processo de regularização em sua história. Até hoje, nenhuma rádio foi legalizada na cidade. O aviso de habilitação do Ministério das Comunicações foi emitido para 110 associações, mas a Anatel afirma que o dial terá espaço para no máximo 30 delas. "Estão na iminência de construir um processo fratricida para as comunitárias", prevê Diogo Moyses, da Intervozes.

A Rádio Heliópolis é a única que não precisará participar da disputa para voltar ao ar. Após um ano de fechamento, a emissora da maior favela de São Paulo obteve autorização para atuar em caráter experimental em uma faixa exclusiva, em parceria com a Universidade Metodista. "Já compramos os equipamentos exigidos pela Anatel com doações de moradores e ONGs", conta Geronimo Barbosa de Souza, o Gerô, coordenador da emissora.

Uma festa celebrará o retorno da rádio em 11 de agosto. A data marca a retomada de um trabalho iniciado em 1992, quando a emissora ainda transmitia a programação por meio de auto-falantes. "Ganhamos a simpatia da comunidade por tocar todo tipo de música e promover campanhas de conscientização sobre cidadania, educação e saúde", diz Gerô. Os problemas, comenta, surgiram em 1997, quando a rádio passou a ocupar uma faixa de transmissão FM.

"Pedimos autorização e não recebemos resposta por oito anos. Somente quando a extinção da rádio ganhou repercussão negativa na imprensa nos apresentaram uma solução." Sobre o futuro, Gerô mostra-se confiante: "É difícil trabalhar sem padrinhos políticos nem verba de igrejas, mas o pessoal da favela mostrou que tem força para continuar".

O teor político do comentário é justificável. Não faltam exemplos para confirmar o controle, direto ou indireto, por grupos religiosos e políticos. Em Bonfinópolis, região metropolitana de Goiânia (GO), a única rádio da cidade, a "comunitária" Líder FM, é gerenciada pelo secretário municipal de Indústria e Comércio, Luiz Carlos Faleiro. Antes, a emissora estava sob o comando de Rosenilda Bezerra, mulher do prefeito Antonio das Graças Filho (PSDB).

Apesar da participação de autoridades municipais, Faleiro garante que a emissora é apartidária. "O prefeito foi entrevistado algumas vezes, mas abrimos espaço para políticos de todos os partidos." Mas quem liga para o estúdio e pergunta quem é o dono pode ouvir como resposta que "a rádio é do prefeito".

É possível encontrar casos semelhantes nas capitais. Em Vitória (ES), a rádio Ponta da Praia é comandada pelo vereador tucano José Carlos Lyrio Rocha, recém-licenciado do cargo. "As notícias passam pelas minhas mãos porque preciso saber o que entra no ar. Mas não há interferência política. Minha única ingerência é escolher a relação de músicas de um programa."

Flávio Casal, diretor da rádio comunitária do bairro Lomba do Pinheiro, em Porto Alegre, diz querer "distância dos políticos". Ele próprio, no entanto, candidatou-se ao cargo de vereador em 2004, pelo PMDB. Perdeu a disputa. "Tive o cuidado de abandonar os microfones da emissora um mês antes das eleições. Não houve aparelhamento político, tanto que nenhum concorrente registrou queixa na Justiça Eleitoral."

Sem o apadrinhamento de políticos, muitas emissoras comunitárias encontram dificuldade para vencer a burocracia estatal ao pleitear uma concessão. É o caso da Constelação FM, fechada pela Anatel em outubro de 2005. A rádio foi criada há oito anos por deficientes físicos, que recolheram doações nos faróis de Belo Horizonte para comprar os transmissores.

"Nossa proposta era reivindicar direitos e sensibilizar a sociedade. Chegamos a arrecadar 50 cadeiras de rodas em doações", conta Roberto Emanuel da Silva, deficiente visual e diretor da extinta rádio. Condenado a dois anos de prisão domiciliar por promover radiodifusão clandestina, ele diz que pediu a outorga da emissora em 2000, mas o processo parou. "Assim que cumprir a sentença, vou solicitar a concessão novamente." – POR PEDRO ALEXANDRE SANCHES E RODRIGO MARTINS


p.s.: a reportagem suscitou a seguinte carta de um leitor, publicada na edição 458 da revista.

"Parabéns ao jornalista Pedro Alexandre Sanches pela excelente matéria sobre a questão política que envolve a outorga de rádios comunitárias no Brasil. Fui durante muito tempo diretor da Rádio Comunitária Serrote FM, uma das poucas que ainda conseguem se manter sem a interferência dos poderes políticos locais. Sofremos todos os tipos de pressão e quase tivemos nosso processo cancelado por conta dos interesses dos políticos locais, que queriam o direito de concessão. Lutamos durante oito anos até conseguir a autorização, mas, diferentemente de muitas rádios comunitárias da região, que possuem sede própria e outros benefícios por pertencer a grupos políticos dominantes, estamos funcionando em espaço emprestado, não temos os melhores equipamentos e enfrentamos todos os tipos de dificuldades para manter a emissora no ar: muitos impostos, burocracia e falta de diálogo com o Ministério das Comunicações."
Marcone Denys
Serrolândia, BA

banda universal

abaixo, a letra de "universom", de sasquat, puma e joul, um rap-canção transfronteiriço interpretado de modo formidável pelo grupo matéria rima.

[um trecho de "universom" pode ser ouvido no site, assim como trechinhos de todas as faixas do incrível disco "procurando respostas", de 2005. a idéia-mestra de "?livro um ler que por" é superlegal, mas recomendo, além de todas as outras, "3 porquinhos (1 ideal)", "de rolê pelo país", "influências", "concreto e anatômico", "procurando respostas" e, em especial, a índio-planetária "a verdadeira história".]

os caras, empenhados num modelo de hip-hop de conteúdo informativo, cultural e educativo, são de barueri, o que explica o modo orgulhoso e delicioso de pronunciar o sotaque de "viajarrrrr", ou de "interrrrrrplanetária", igual fazem(os) os paulistanos da periferia, os paulistas do interior, os interioranos de paraná, mato grosso etc.

na introdução, um diálogo entre humaníssimos robozinhos se estabelece: "checando informações", "sistema solar, planeta terra", "recepção de rádio-freqüência", "ok, acionando parabólicas para recepção".

a conexão eletromagnética se faz, e sons de rádio começam a tagarelar: "four o five [não entendo a língua], good morning!". e o robozinho volta, interfere: "freqüência errada! freqüência errada! tente outra!".

e se inicia o interplanetário rap-canção:

"(refrão)
vem viajar na nave interplanetária
aperte o play, coloque a lupa rumo à galáxia
vem viajar na nave interplanetária
um som que chapa o globo, o universo sai da caixa

big bang, tudo começou: uma grande explosão, o universo se criou
quem diria, uma bola muito quente de gás
esfriaria, explodiria milhões de anos atrás
formando protogaláxias, evolução, vieram as galáxias
cuja mãe das estrelas iluminam o céu. que beleza!
o brilho de uma estrela é medido em magnitude
quanto maior o brilho, maior sua plenitude
atitude de infância, contar estrela no céu
pensamento de menino, "o que vem depois do céu?"
et, marciano, claro ou escuro
gente da gente, será o absurdo?
paro, tento imaginar
o que o universo tende a nos revelar?

(refrão)

o sistema solar revela uma estrela central (sol!)
e corpos que orbitam ao redor do seu quintal (são:)
61 luas, asteróides, cometas, planetas
contém também (gás!) interplanetária poeira
celebridades pertencem a dois grupos pequenos, planetas rochosos de tudo
mercúrio, vênus, terra, marte
desperte o robô, aperte o start
gasosos júpiter, saturno, urano, netuno
vem com a gente viajar, dar uma volta no sistema solar
igual plutão, distante, nosso amor
distante ou não, que importa é calor
lua e sol, eclipse, não tem jeito de fugir
destino já se traçou e tudo se unificou

lua, sol, corpos celestes
via láctea, galáxia, paciência, teste
a humanidade vive a perguntar
se existe vida em outro lugar

(refrão)"

cê tá entendendo?

terça-feira, agosto 21, 2007

banda larga vs. banda estreita, 2

a discussão estética, meramente estética, é escravagista.

sexta-feira, agosto 17, 2007

banda larga vs. banda estreita

o gilberto gil que estreou o show "banda larga" há poucas horas atrás, no citibank hall, em são paulo, parecia nitidamente um homem dividido em dois, um homem bipartido.

eriçado de confortável desconforto, o ministro-cantor fazia-nos crer que é um homem que não quer mais ficar na política, mas também não quer voltar para a música - ou melhor, um homem que quer continuar na política, mas também quer voltar para a música. ou tudo isso junto e embaralhado, multiplicado por dois, dividido por dois, como dois e dois são cinco.

assim dividido, seguiu transgredindo arriscados limites (ou falta deles) entre público e privado, entre o artista politizado que apresenta canções inéditas de rara coragem (uma estonteante sobre o "oco do mundo", outra arrepiante sobre a antevisão medrosa de sua própria morte, de inovadora nudez) e o político que aglutina com desfaçatez patrocínios corporativos da ig, da gol, das globos, da rádio não lembro qual, da grife gege.

assim cindido, oscilou entre o reformista progressista que pressiona e impulsiona a cultura para frente e para cima e o coronel antigo que ergue a voz para se fazer ouvir mesmo à revelia, entre o artista-político cansado e o político-artista que renasce renovado a cada dia.

assim indeciso, celeberou o funk e o samba e o reggae e a novidade que sempre vem dar nas praias brasileiras, quase ao mesmo tempo em que cedia ao ancestral deslumbre novo-rico de expor a filha preta, contando feliz que ela viajou para nova york só para ver beyoncé ao vivo, só para pagar 500 doletas para ver beyoncé de perto.

assim bipartido, celebrou o novo e os novos e criticou suavemente os artistas "conservadores" que se impertigam apavorados diante das possibilidades de código aberto, de copyleft e de generosidade intelectual oferecidas pela internet. nesse exato instante, ouviu vaias tão indecisas quanto reacionárias (ó, santa tropicália rediviva!, alô, tom zé!), foi hostilizado, repreendido, reprimido. viu erguer-se diante de si a voz brasileira intolerante e autoritária que anda teimosa e nervosa em se consumar nuns vários rictos de "cala a boca".

nesse exato instante do "cala a boca", fez renascer a voz autoritária (mas, em seu caso particular, nunca intolerante) do coronel que cala os outros no grito, "eu canto para vocês, mas [cresce o tom de voz] deixa eu falar". e chorou, falando dos filhos, dos meninos, dos novos.

fechava ali o que parece ser um ciclo interno de mudança, de transformação. pois, ao mesmo tempo em que cumpria o ritual pastoral subserviente de sempre, de fazer "iô-iô-iô" e levar o rebanho feliz a mugir "iô-iô-iô", também sentia e causava desconforto, rebeldia, vontade de desobedecer.

e, naquele ritmo, o "grande" público (aí incluídos fãs fanáticos, aí incluídos críticos cricris), esse que sempre gosta de fantasiar que o ídolo é um seu escravo ao tempo mesmo em que se deixa escravizar pelo dito cujo, entrava em parafuso de esquizóide confusão. aplaudia o artista que fazia função de político e/ou hostilizava o político que vestia a fantasia de artista, ou melhor, vice-versa, tudo junto-separado e embaralhado, no espelho, como dois e dois são sessenta e cinco.

intolerante e irritada, a platéia se dividia no espelho do artista, e trocava as bolas da (in)compreensão apupando o velho coronel mais ou menos quando ele tentava soltar o pavão mysteriozo ("não gruda", "não gruda", esgrimia gilberto num brilhante xaxado novo), ovacionando o rebeldade bem quando ele gritava o "gimme your love" de "vamos fugir" com o rosto e o corpo faiscando ódio selvagem, reprimindo o neocoronel quase nos interlúdios em que ele ensaiava libertar o pássaro proibido ("piolho", "lambreta", "quer alho", "que saco", ameaçava, avisando que não faria a "rima fácil", quase fazendo).

as corporações e os partidos políticos e as igrejas e os fã-clubes e os jornal gotejavam o pus do oco do mundo, naquele mesmo instante em que o poeta (pastor?) avisava que não temia a morte, porque ela estará depois dele, mas morria de medo de morrer, porque esse ato ele mesmo terá de protagonizar. vaiado & aplaudido, aprendia atrasado a lição trazida pela filha preta-deslumbrette, que pouco tempo atrás tirou do armário geral da nação o monstrinho escondido dentro do travesti que queria tomar o lugar da rita lee. naquele dia em que gil(berto) (re-)encontrou a preta, a rita, o pitta, o travesti e a si, todos juntos reunidos numa pessoa só, ele também chorou, a cântaros.

ele(s) que vá(ão) se preparando, drão, que ainda temos muitas lágrimas a derramar. pois a transfiguração do casulo à borboleta não é mesmo fácil, não (dá vertigem de morte, que, quando a gente não se esconde do inevitável, logo vira magnífica canção, daquelas que pouquíssimos ousariam fazer). mas está acontecendo, o casulo está se rompendo, paratodos nós, cada qual a seu modo.

e é aí que grita a lagarta-borboleta, o rei-bipartido-novamente-nu: viva cartola, gordurinha, jackson do pandeiro, luiz gonzaga, zé keti, bob marley, roberto carlos ("não gruda"?, sei, sei...), germano mathias, gilberto gil, e ben gil, e funk-electro-carioca, e youtube, e egotrip, e os novos que (não) estavam ali, e os anos de 2001 e 2(222) e 3 e 4 e 5 e 10 e adiante. avante.

quarta-feira, agosto 15, 2007

agridoce, vol. 3: a(s) desbravadora(s)

diziam os velhos coronéis nacionais (ainda dizem, os coronéis eletrônicos?): o brasil é uma democracia racial (você acreditou?, acredita?).

mas e a música popular brasileira, aquela que é (era?) governada pela ordem dos músicos do brasil, será que a mpb também é uma democracia racial?

a música popular brasileira é uma democracia étnica, religiosa, política, sexual?

por exemplo, quantas mulheres compositoras se impuseram no brasil dos anos 10, 20, 30, 40, 50, 80, 90? quantas (e quais) nos anos 70?

quantas mulheres compositoras vêm se impondo no brasil dos anos 2000? quantos ouvidos você tem dado a elas (& outra/os mais)?

fala dona sueli costa, em entrevista originalmente publicada no site da "carta capital", em 30 de julho de 2007.


A desbravadora Sueli Costa
Sempre discreta, a compositora de sucessos dos anos 70 como Jura Secreta e 20 Anos Blue volta a cantar e usa a internet para difundir sua música

por Pedro Alexandre Sanches

Nos anos 70, Sueli Costa se fez desbravadora entre compositoras brasileiras, ao fornecer sucessos de clave bem feminina (e por vezes politizadas) a intérpretes como Nara Leão, Simone, Elis Regina, Maria Bethânia, Gal Costa, Fagner, Nana Caymmi, Marília Medalha, Cauby Peixoto, Ney Matogrosso e muitos outros.

No CD independente Amor Blue (que Sueli vende em seu próprio site, www.suelicosta.com.br), a trajetória errante de cantar é retomada por uma artista que não se vê como cantora. E de fato não o é. A meta é enfileirar canções inéditas com um leque aberto de parceiros (Ana Terra, Paulo César Pinheiro, Abel Silva, Fausto Nilo, Paulo Emílio, Carlinhos Vergueiro, Paulo Mendonça, Ana Maria Bahiana, Luiz Sérgio Henriques) e participações vocais (Simone, Nana Caymmi, Maria Bethânia, Daniel Gonzaga, Celso Fonseca, Fernanda Cunha).

Autora de canções tristes que ficaram populares nos anos 70, como 20 Anos Blue, Jura Secreta, Coração Ateu, Assombrações, Acorrentado, Encouraçado, Medo de Amar, Dentro de Mim Mora um Anjo, Açúcar Candy e Vida de Artista, Sueli fala sobre a volta.

CartaCapital: Fazia sete anos que você não lançava um disco. O que andou fazendo nesse hiato?

Sueli Costa:
Entrei na Lei Murilo Mendes, da Prefeitura de Juiz de Fora. Fiquei até com medo de não passar na lei, porque já sou mais conhecida, mas acho também que a vida da gente começa todo dia, compositor é isso aí. Aí fui contemplada pela lei, e consegui fazer esse disco assim, com a família trabalhando, minha sobrinha Fernanda Cunha produzindo, meu filho fazendo o encarte, meu sobrinho fazendo a capa... Arregacei as mangas, fiz os arranjos, toquei os pianos e chamei os amigos. Tinha uma vontade muito grande de fazer um disco com Nana Caymmi, Simone, Maria Bethânia.

CC: É a primeira vez que você toca piano e faz arranjos num disco, não é isso?

SC:
É. Tem muita gente que gosta do meu piano, e eu sou apaixonada por outros pianos. Mas desta vez arregacei as mangas.

CC: Você não é uma cantora constante. Como é para você gravar?

SC:
Não, não sou cantora, não. Deus não me deu essa graça. Mas mostro as minhas músicas, né? Não pretendo ser mais do que eu sou. Eu sei mostrar uma música, e esse disco é um meio para mostrar minhas músicas novas. E está em primeiro lugar de vendas na (loja carioca de discos) Modern Sound, maravilhoso. É um disco sem gravadora, sem nada. Estou vendendo no site e tem gente que pede mais, pede o disco anterior. Fiz uma prensagem pequena, 400 discos com a prefeitura, e vou reprensar agora, rapidinho, correndo.

CC: Quantos anos já são de envolvimento com a música?

SC:
Acho que desde que nasci. Minha mãe era pianista e professora de música, eu com quatro anos tocava piano, antes de ser alfabetizada. Música gravada, mesmo, foi em 1967, estou fazendo 40 anos de música gravada. Foi Nara Leão que gravou a primeira música (Por Exemplo: Você). Antes eu tinha feito show, música para teatro em Juiz de Fora, festival...

CC: Como você se vê dentro da história da música brasileira? Qual tem sido seu papel?

SC:
De trabalhadora mesmo, de operária, junto com todo mundo. Não sei viver sem isso. Às vezes está bom, às vezes está ruim, mas eu não saberia fazer outra coisa.

CC: Apesar de ter feito uma série de discos, você sempre foi primordialmente uma compositora. Não é um ofício dos mais fáceis, não?

SC:
É, eu nunca pensei em ser cantora. Tomei um susto quando fiz meu primeiro disco, em 1975. Achei que era um disco para registrar as músicas, mostrar. Não achava que eu tinha que cantar. Mas Paulinho da Viola ia ao Nordeste com uma turma, com Fagner, Moraes Moreira, um time de futebol, um audiovisual e um show de música. Paulinho me convidou para ir junto, nós fomos atrás, e eram lugares grandes, com mais de mil pessoas, duas mil pessoas, ginásios.

CC: E você cantando?

SC:
Eu cantando, fui batizada assim (ri).

CC: Foi traumático?

SC:
Não, foi maravilhoso. Era uma energia muito grande. E eu estava ao lado de amigos. Era uma cumplicidade muito grande, uma unidade muito forte com todos eles, era uma geração, mesmo. Eu jogava no time de futebol, com Copinha, que era flautista, tocou com Carmen Miranda. A gente ficava jogando uma bolinha no hotel.

CC: Gonzaguinha produziu seu primeiro disco, João Bosco e Aldir Blanc produziram o segundo. Eles todos ficavam incitando você, querendo convencê-la a cantar?

SC:
Não, acho que gostavam mesmo das minhas músicas. Quando fui fazer o primeiro disco, Gonzaguinha se ofereceu (suspira)... Depois, no segundo, eu estava muito junto com Aldir e João, a gente se encontrava todo fim de semana. Pus na mão deles, Gonzaguinha disse "ah, estou morrendo de ciúme" (ri). Mas todo mundo sabia que eu não era cantora. Nossa geração foi também um geração de compositores que cantavam.

CC: Existiam pouquíssimas compositoras, não?

SC:
É, eu acho que estava um pouco isolada nessa época. Só tinha a Joyce.

CC: Por que isso?

SC:
Não sei, hoje há muitas compositoras, mas na época não havia muitas, não. Eu sempre andei no meio de homem (ri). Me lembro de Juiz de Fora, minha casa ficava lotada no sábado e no domingo, era bateria na sala, piano, um tocando. As mulheres que tinha lá eram namoradas e mulheres dos meus amigos, sabe?

CC: Por outro lado, muitas cantoras gravaram, sua obra ficou marcada como algo muito feminino.

SC:
É. Mas acho que as mulheres também demoraram um pouco para chegarem às paradas de sucesso. Me lembro de quando Clara Nunes entrou na parada de sucesso, em 1975, ela foi a primeira mulher a alcançar o topo das paradas. Era uma coisa mais de homem, sabe? Aí as mulheres tomaram realmente, acho que a partir da Clara.

CC: E muitas delas cantando músicas que você fazia...

SC:
Tem mais mulher, mesmo, cantando minhas músicas. Como acho que tem mais mulher cantando, né?

CC: Você é tida como uma artista que foi politizada, participante nos bastidores. Como era isso?

SC:
Não sei, não... Eu fui de uma geração que nasceu numa ditadura. Meu primeiro disco é de 1975, antes da abertura.

CC: Teve episódios com a Censura?

SC:
Tive, tive, tive. Todo mundo tinha. Não tinha um que não tivesse. Era uma implicância, os caras viam cabelinho em tudo. Tive uma música, Cordilheira, que Erasmo Carlos chegou a gravar e não saiu. Só saiu agora, na caixa de CDs dele. Foi a primeira pessoa a gravar Cordilheira, e a Censura pegou.

CC: Qual era a alegação?

SC:
Barravam, não falavam nada. Tive que ir a Brasília com (o co-autor) Paulo César Pinheiro para tentar liberar, falar com o chefe da Censura, uma coisa terrível. Corri com Paulinho atrás disso, ele em Brasília pisando no meu pé porque eu estava dizendo para o censor: "Escuta aqui, o cara sabe o que está prendendo, qual é a palavra que eu não posso usar? Eu preciso de parâmetros para compor daqui para frente".

CC: E o censor respondia o quê?

SC:
Nada. Nada. "Não, esqueça essa música." Falei "esquece?", você faz música, não pode esquecer. E Paulinho pisando no meu pé.

CC: O que você entendeu na época? O que essa música dizia de incômodo?

SC:
Ah, falava muita coisa... Mas... (longo silêncio) não sei... Era tudo que a gente fazia. Tive uma música censurada, Altos e Baixos, que depois Elis gravou, já nos estertores da Censura, bem no final, porque quando a coisa está acabando fica pior, né? Falava de uísque, Dietil, Diempax. A música foi censurada, por causa do Diempax. Elis disse para mim: "Eu vou liberar, eu libero, vou conseguir, tá acabando". Meu Deus do céu, se fosse pelo uísque, já era uma coisa, mas Diempax é um remédio que minha mãe toma. Era uma coisa doida. A gente fazia show beneficente, entrava no Teatro João Caetano cantando em benefício de alguma coisa ou de alguém, e não podia cantar as músicas. "Cordilheira não pode", diziam. Aí eu falava: "Agora vou cantar Cordilheira", e cantava Dentro de Mim Mora um Anjo. Anunciava o nome de uma e cantava outra.

CC: Mudou muita coisa dos anos 70 para o momento atual?

SC:
Culturalmente, sim. Na Odeon, a gente era artista (ri), tinha cordas, metais à disposição, podia gravar. Hoje não tem dinheiro para fazer um disco. Hoje você tem que fazer um disco para dar para a gravadora lançar. As gravadoras nem compram o disco, pegam e lançam, você dá de presente.

CC: Você não fez isso, não é?

SC:
Não, não, não. Tentei, não tive uma boa proposta. Estou comemorando meus 40 anos de carreira, vou em frente, acho que vai dar certo. Queria mostrar minhas músicas novas, fiz um disco cheio de participações, e de parceiros também. Cada parceiro tem uma música. Só sinto falta de Aldir Blanc, queria fazer uma com ele, mas não deu tempo. Tem um chorinho que eu ia dar para ele, mas vou ver se fica para o próximo disco. Já estou pensando outro.

CC: Esse é o lado bom de não depender mais de gravadora?

SC:
Eu acho que gravadora está acabando, tem hora que eu acho. Estou conseguindo vender disco na internet, quase fiquei doida aqui, porque inventei esse negócio de vender pela internet. Eu não sabia que estava lidando com fã-clube de Simone... O disco também teve críticas ótimas. Aí começou a chover e-mails, eu falei "meu Deus do céu, Fernanda, você não tem uma secretária para me ajudar?". Passei a responder e-mail um atrás do outro.

CC: Quando você vende CD desse modo, é você mesma quem envia para a pessoa?

SC:
Eu que envio, claro. Acaba um, começa outro. Mas é bom também, é um contato legal com pessoas que gostam do trabalho.

CC: Esse contato direto não existia até há pouco, não? É difícil imaginar o próprio artista mandando o disco para o fã.

SC:
É. Com esse dinamismo, arranjei vários amigos. É engraçado, você fica íntima das pessoas. É legal, tem cara que compra para a mãe, depois a mãe quer comprar mais dois para dar para as amigas. É muito engraçado. Acho legal esse contato. Gosto de fazer show, quando canto eu gosto, porque estou ali com as pessoas que gostam da minha música e estou vendo aquela reação de perto. É uma troca, tem uma energia bacana que você joga e ganha de volta. Acho que essa coisa de internet é parecida. Você tem contato com quem gosta, e tem mais gente que gosta de você do que você pensa (ri).

quinta-feira, agosto 09, 2007

agridoce, vol. 2: desiventando(-se) tom zé

uma pequena resenha sobre o excelente documentário "fabricando tom zé", do jovem décio matos jr., foi incluída na edição 453 da "carta capital", de 18 de julho de 2007, e é ela que eu copio aí mais abaixo, numa tentativa de manter viva a chama.

pelo que eu sei, "fabricando tom zé" ainda está em cartaz em são paulo (e nas outras cidades?...), exposto (ou melhor, escondido) nalgum horário diurno dalgum cinema "da moda" da cansei-city. a trajetória do documentário é fenomenal: ganhou "grandes prêmios" do público (atenção, do público, entendeu?) em alguns festivais de "porte" por onde passou (tipo assim, a egg-city e a cansei-city, mora?), mas não gerou comoção equiparável junto à "grande" imprensa e à mídia "grande" plantadas no coração das (super-)ego-cities.

e eu fico aqui matutando, me perguntando: será que o pessoal não assistiu a "fabricando tom zé"?, será que a turma não percebeu o relicário riquíssimo de informações e depoimentos inéditos e contundentes escondidos (ou melhor, expostos) dentro do filme?

mais ainda, queimo minhas pestanas: o que será que a patota que integra os setores pseudotropicalistas da cultura brasileira está achando de "fabricando tom zé"? o que será que causa esse silêncio tão ensurdecedor em torno daquele filme despretensioso, simpático, mimoso? nenhum pinguinho de curiosidade, por parte da comunidade pseudo-tropicalista, da trupe tropicalista, da patota não-tropicalista, da multidão nada-disso,-muito-pelo-contrário? estraaaaaanho.

respostas a tais indagações serão devidamente recebidas na caixa postal 000, de madame zoraida, na rua dos bobos, número zero, cep 00000-000.

mas, enquanto não chegam as missivinhas a madame zoraida, zeróida - cigana, cartomante, quiromante, funâmbula e leitora charlatã de bolas falso-brilhantes de cristal -, euzinho anexo à resenha da "carta capital" uns "bonus tracks" (a city of tired people e a omelete city costumam apreciar, não?) de tom zé. o que vai aí, mais embaixo do embaixo, são 1) frases do radical-tropicalista baiano-paulista tom zé, extraídas do filme de décio matos jr., e 2) excertos de falas do dito cujo, durante entrevista telefônica que lhe fiz para repercutir "fabricando 'ele mesmo'". madame zoraida agradece, condoída, la cumparsita.


A desinvenção de Tom Zé

O documentário foi concebido para louvar a figura do protagonista, mas não deixa muito espaço para meios termos. Astro pop brasileiro, o protagonista aparece furioso, dando empurrão num técnico do festival suíço de Montreux. Surge mergulhado em vaias durante um show na França e depois sorri, conformado com o "dia de bucha". Aparece iconoclasta, chamando de "patetas" os colegas co-criadores do movimento tropicalista, Caetano Veloso e Gilberto Gil.

Mas, não, não é jamais um retrato negativo o que o cineasta Décio Matos Jr., 28 anos, constrói do protagonista no longa-metragem Fabricando Tom Zé, em cartaz desde a sexta-feira 13. O Tom Zé que povoa a tela é zangado, imperfeito, falho, nervoso, mas também é terno, amoroso, divertido, vitorioso, apegado à esposa (por sinal, a até aqui anônima Neusa se expõe e transborda como uma das revelações do filme).

O retrato final desestabiliza quaisquer clichês de artista sempre feliz, sempre sorridente, sempre bonzinho, um poço de virtudes. Tom Zé não aparece assim no filme. Aparece humano, simplesmente. E assim ajudou Matos Jr. a conquistar os prêmios de melhor documentário pelos júris populares das mostras de cinema do Rio e de São Paulo de 2006.

O processo não foi tranqüilo, como conta o artista. "Fiquei brigado com Décio, passei dois meses sem falar com ele, porque tínhamos combinado de não incomodar Caetano e Gil com entrevistas", conta. O diretor desobedeceu. E obteve um depoimento inédito de Caetano, sobre Tom Zé ter sido "tirado da foto" da tropicália até a redescoberta, lá fora, nos anos 90. "Há talvez algo de mesquinho, inconscientemente, na nossa atitude", diz Caetano.

Quando Tom Zé viu o filme pronto, mudou de idéia e aprovou o resultado. E lá estão as imagens da briga com os técnicos de Montreux. "Minha banda é banda de preto, feio, vagabundo, ninguém fala inglês, é preconceito?", esbraveja no ensaio. Mais tarde, desabafa para a câmera: "Eles têm tudo, escola, educação, beleza, pele boa, cabelo bom. Veja as figuras de nós, que estamos fazendo o espetáculo deles. É todo mundo com a pele ruim, feios, desgraçados, mal penteados, mal vestidos. O Brasil pobre traz a música com que eles conseguem manter este festival em pé".

Por essas e outras, fica impressa na mente uma das imagens finais do filme, quando um Tom Zé desenhado vai caminhando para longe, cada vez menor, enquanto a sombra que deixa atrás de si cresce e se agiganta mais e mais. Eis a metáfora. - POR PEDRO ALEXANDRE SANCHES


bônus 1: frases de tom zé no filme

"por causa do ritmo eu deixei de apanhar na vida."

"é à meia-noite que o dia começa."

"mande a embaixada do brasil para a puta que pariu e deixa o povo sentar." (a neusa, diante das cadeiras reservadas à embaixada brasileira, nalgum chiquetérrimo palco europeu.)

"como sou absolutamente analfabeto, a pessoa compreende logo e se torna solidária."

[1a, frase de arnaldo antunes: "é o mais nordestino dos tropicalistas, e o mais paulista."]

"a pessoa já está encantada em seu próprio espelho. eu, não, nasci patinho feio." (comparando-se a outros pop stars.)

"uma sombra minha" (referindo-se à esposa, neusa.)

zangado na passagem de som em montreux, prestes a entrar em conflito com os técnicos locais: "esta banda é louca, não tem juízo"; "a gente pára"; "é melhor a gente ir para casa"; "talvez a pessoa não gosta do estilo, chama outra banda que toca no lugar em gente"; ",inha banda é uma banda de preto, de feio, de vagabundo, ninguém fala inglês. é preconceito?"; "vá pra porra, não venha me dizer oh oh, não" (depois que o técnico diz que ele tem que ser "preciso", tem que explicar que freqüências precisa, em vez de "blah blah"); "estão me desrespeitando, não me diga 'cala a boca'!".

para a câmera, após o conflito: "eles são humilhados por aqueles que eles humilham. eles têm tudo, têm escola, educação, beleza, pele boa, cabelo bom, cosmético, veja as figuras de nós, que estamos fazendo o espetáculo deles aqui. você viu essas menininhas aí do maranhão, tudo pequetutu, umas molecas desse tamanho, mal vestidas, pobres, com a pele ruim. é minha banda, é eu, todo mundo com a pele ruim, feios, desgraçados, mal penteados, mal vestidos. e entretanto eles, que têm tudo, têm dinheiro, têm riqueza, têm escola, têm eletrônica, têm puta que pariu, eles não têm música para botar aqui. o brasil pobre tá trazendo a música que eles conseguem manter esse festival em pé. eu estou falando de montreux".

"eu ainda sou uma ousadia, um desplante mais ofensivo. eu, além de ser pobre, brasileiro, terceiro mundo, filho da puta, miserável, ainda faço uma música sofisticada."

"ele estava humilhando o brasil, humilhando pobre. todos rapazes guapos, lindos. o próprio explorador, não tenho nada com isso, acho as pessoas bonitas bonitas, desde que não comecem a agir vilmente. enquanto agem com respeito, se foram mais sabidos, roubaram a gente, eu aceito a regra. mas não venha ser vil, filho da puta."

"não há artista no mundo que tenha um acontecimento desse, porque os outros são humilhados, são fodidos, são postos para fora."

para a câmera, sorrindo, logo após ser vaiado num show na frança: "para vocês verem que também tem dia de bucha".

sobre o desterro após a diáspora tropicalista: "1968, caetano veloso e gilberto gil foram presos. começaram a fazer fuxico de mim, e eles acreditaram, veja que patetas. todo mundo no brasil espalhou a notícia: tem uma vaga no tropicalismo. todos foram a londres, porque iam me substituir".

sobre o desterro na bahia natal, pós-tropicalista, no início dos anos 90: "todo mundo junto, o prefeito da bahia, próximo carnaval ia ser sobre o tropicalismo. quando sou chamado, 'vem?', 'claro que vou!', 'não tem foto sua no carnaval'. não tem minha foto no carnaval? quem tirou minha foto do carnaval da bahia?".

[1b, frases de caetano veloso: "por que ninguém disse nada?, por quê? é uma pergunta pertinente, que a própria pessoa se faz. eu não fiz nada. é evidente que todo mundo tem sua dose de egoísmo, às vezes pode ser mais fácil não ter esse complicador que era o tom zé. há algo de mesquinho talvez, inconscientemente, na atitude nossa".]

[1c, frase de gilberto gil: "quando voltamos do exílio, ele já estava recolhido. tom zé se recolheu mesmo".]

"eu fiquei doente, triste, fodido, invejoso, filho da puta, desgraçado. levantava de manhã para enganar a neusa. não ter energia é uma experiência fantástica, não ter energia para suspender uma mão."

[1d, frase de caetano veloso: "o brasil e nós todos que somos o brasil quase deixamos o tom zé ser esquecido, em muito pouca medida pelas carências, incapacidades ou incompetências dele e muito mais pela singularidade da genialidade dele".]

[1e, depoimento do crítico arthur nestrovski. ele opina que o desterro de tom zé teria partido do próprio tom zé, que naquele momento não estaria interiormente preparado para assumir o papel histórico que caetano e gil viriam a assumir.]

"eu não sou gênio, eu sou japonês."


bônus 2: frases de tz em entrevista telefônica com pas

"no rio, teve a surpresa agradável de o público eleger o filme, em são paulo aconteceu novamente de ser o prêmio do público"; "décio me contou algumas peripécias, uma coisa meio fantástica, que, quando o filme passou na costa leste dos estados unidos, o disco 'estudando o pagode' esgotou nas lojas"; "há um pedido para ter uma sessão especial na bahia"; "o que vi no rio e em são paulo foram platéias de cineastas. no rio foi uma verdadeira comoção, no meio da exibição".

"já não me queixo da mídia. se fosse ter queixas, seria de as pessoas parecerem que têm receio de ir aos shows."

"eu estava meio brigado com o décio. tinha combinado que não íamos incomodar caetano e gil, de repente um belo dia ele me disse que ia levar ao caetano. falei que não. ele disse 'eu respeito você como músico, você me respeita como documentarista'. 'documentarista, uma porra, você entrou em casa de coeiro, quando acabar o filme você vira documentarista.' passei dois meses sem falar com ele. o filme veio para cá e eu vi, neusa quis que eu visse porque ficou com medo da cena da vaia. aí vi que eles tinham feito um trabalho formidável, por habilidade deles, dosando cada milímetro."

"caetano disse 'você queria os chatos de sempre no filme', mas isso é algo que sempre me incomoda. parece que sempre as pessoas me procuram, começam falando comigo, e terminam me perguntando como fazem para falar com caetano. não gosto disso, quando gil entrou no ministério da cultura, não falei mais com ele, eu me afasto."

"o episódio de montreux foi muito sabiamente tratado, colocaram todo o aborrecimento que já estava na situação. não sou um doidivanas que faz isso o tempo inteiro. puxa, eles fizeram uma coisa bonita"; "tem que ter o momento em que você cochila, tudo isso é linguagem".

"acho que [os técnicos de montreux] pensaram 'esses sons do brasil é só ligar, não tem problema'"; [depois de ele se zangar] devem ter pensado 'qual é o mal-educado que está aqui profanando o templo da música?'. ficaram na mesa de som dando risada. e eu fiz uma coisa de teatro, fiquei fazendo tai-chi, com toda calma, só olhando. em meio minuto não tinha mais ninguém rindo".

"tomamos um susto [diante do depoimento de caetano], porque parecia que aquele assunto nunca viria à baila, 'temos que agüentar essa porra desse cara, era melhor que continuasse mudo'."

"eu fui retirado do retrato. [pergunto sobre a proposição de arthur nestrovski, de que ele próprio se retirou do retrato] também é verdade, minha psicanalista falava isso e fala até hoje. também fui muito beneficiado por ter nascido perto de dois gênios. há aquele ensinamento que quando um amigo seu está se afogando você não deve pular na água, senão morre junto com ele."

"chacrinha botou meu verso na televisão, 'eu tô te explicando pra te confundir', e eu não tive coragem de pedir à gravadora que explicasse que a frase era minha, não era do chacrinha"; "não sou sobre-humano, tenho inveja, paixão, ressentimento. sempre tratei isso com dignidade".

"a humanidade só pode se interessar por alguma coisa se tiver também a parte humana, falível, medrosa, escorraçada. quando vi a vaia, achei 'que bom'."

"claro que é aliviante [ver incluída e publicada em 'fabricando tom zé' a série de desabafos que ele faz]."


3

só um encadeamento de conclusões minhas, antes de terminar: em 2005, em "estudando o pagode", tom zé erigiu a "opereta segregamulher", para denunciar a segregação machista da sociedade sobre as mulheres (a patota pseudotropicalista saiu correndo fugida de "estudando o pagode", junto com a patota antitropicalista, por que será, né?). tom zé costuma dizer que é mulher, que é feminino. logo, a "opereta segregamulher" é também a "opereta segregatomzé", a "opereta segrega-te-a-ti-mesmo" (cê já viu?, já ouviu?).

e assim é que, juntos, os acontecimentos exuberantes de "fabricando tom zé", de montreux, da vaia e do novo diálogo (indireto, intermediado por décio) com caetano e gil soam como um desabafo pós-"opereta", o desenlace aliviado de um auto-aprendizado interno que, sempre que enfrentado, resultará em novos e suculentos frutos logo ali adiante.

e, além do mais, há neusa, "mulher-sombra", crescendo junto com tom zé atrás (e na frente) de "estudando o pagode", de "fabricando tom zé", deste brasil novo que canta de galo (e/ou de galinha) diante dos "primeiros" mundos. cê tá entendendo?

(ih, o bônus 3 nem foi anunciado e avisado, mas havia...)

quinta-feira, agosto 02, 2007

agridoce, vol. 1

[p.s. (só num blog para o post scriptum vir antes do scriptum, né?...): a parte 2 deste tópico agridoce foi incluída posteriormente, na tarde de sexta-feira 3 de agosto, porque lembrei que ajudava e complementava o assunto-ben-jor, e todos os outros acres & doces das redondezas.]

1
"carta capital" 450, de 27 de junho de 2007. voa, jorge, voa.

(mas como é que a gente vai traduzir o fato de que, em plenos anos 2000, o autor de "país tropical" e "brasil, eu fico" foi morar em miami? iracema voou?)


O "EFEITO FÊNIX"
Com 44 anos de estrada, Jorge Ben Jor divide-se entre o culto à originalidade da obra que criou e o desgaste de fórmulas

POR PEDRO ALEXANDRE SANCHES

Jorge Ben Jor, 65 anos, se debate no palco da Casa Fasano. O objetivo é entreter uma platéia composta majoritariamente por espectadores de terno e gravata, num show fechado exclusivamente para clientes da Terco Grant Thornton. Até mesmo a assessora de imprensa da empresa de auditoria e consultoria estranha a escalação e palpita que um show de bossa nova combinaria bem mais com o público em questão.

Na madrugada, depois de extrair dos engravatados algum nível de animação, Jorge comenta a apresentação: "Está todo mundo ali, diretor, presidente da companhia. O pessoal fica comportado, até para dançar". Diz que a inibição alheia não o inibe: "Não faz diferença. A gente toca porque tem que tocar. Isso é que é a prova dos noves, fazer esse público gostar da sua música e dançar". O presidente da empresa e a esposa acabam subindo ao palco e caindo na dança.

Não é situação de exceção: shows chiques e fechados costumam aprimorar a sobrevivência não só de Ben Jor, mas da maioria dos astros pop. Mas enfrentar situações de deslocamento como aquela é a tônica de 44 anos de carreira profissional do autor de Fio Maravilha e Taj Mahal.

Parceiro do artista quando ele se chamava Jorge Ben e cantava acompanhado pelo Trio Mocotó, entre 69 e 72, João Parahyba remonta o desconforto aos primórdios: "Ele já ficava meio deslocado em tocar Mas Que Nada no Beco das Garrafas (o templo da bossa nova em que Ben estreou, em 63). O som moderno da época era o jazz, que não se encaixava bem na cabeça dele. Ele vivia muito com o pessoal do rock, Os Incríveis, Roberto e Erasmo".

Das origens fala também Wilson Simoninha, filho de um amigo próximo de Jorge, o controverso Wilson Simonal, ídolo popular que caiu em desgraça sob acusações de ser colaborador do regime militar e em 74 acabou perseguido e preso pelo mesmo regime.

"Roberto, Erasmo, Jorge, Simonal e Tim Maia eram todos caras periféricos, sem formação universitária, numa época em que a formação universitária era tudo. Sofreram bastante com isso, como também Elis Regina. Foram patrulhados e tiveram que aprender a lidar com isso. Todos foram em casa visitar meu pai quando ele voltou da prisão", diz Simoninha.

"Jorge sempre foi presente. Talvez não ficasse tão próximo mais por culpa do meu pai, que carregava o receio de estar prejudicando pessoas de que gostava", continua. "Por muito tempo esqueci isto, mas quando meu pai foi preso Jorge foi o cara que ia em casa todos os dias para brincar comigo. Foi chocante para mim, com 8 anos, os policiais em casa, a história no Jornal Nacional."

No início dos nos 90, Simoninha se integrou à Banda do Zé Pretinho de Jorge. E foi um dos articuladores de mais uma retomada, dessas que um amigo de décadas, Washington Olivetto, chama de "efeito Fênix". O publicitário fala de Jorge: "Ele tem as mesmas maluquices que as pessoas creditam a Roberto Carlos e Tim Maia. Só faz o que quiser, na hora que quiser. É o único artista brasileiro que se relançou quatro vezes com o mesmo êxito. Ciclicamente, se reinventa, ou é reinventado".

O triunfo, na ocasião, veio com a massificação do funk W/Brasil (Chama o Síndico), inspirado pela agência de propaganda de Olivetto. Os envolvidos garantem que W/Brasil não foi gestada por nenhum golpe de marketing. "A gente fazia muitos shows pelos subúrbios, que em São Paulo chamam de periferia, e todo mundo cantava. Foi pegando, saiu das ruas para o rádio", descreve Ben Jor.

Mas, logo após a explosão, a carreira passou a ser administrada por Manoel Poladian, um dos mais vorazes empresários musicais do País. "Começou a trabalhar daquela forma conhecida, Jorge ganhando dinheiro a rodo, Poladian botando dinheiro a rodo", afirma Simoninha.

Poladian rebate, por e-mail, a idéia de que a exploração do êxito de W/Brasil tenha exaurido a imagem do artista: "Só um leigo pode classificar de superexposição a execução de uma música de qualidade. Nenhum artista tem desgaste enquanto faz um bom trabalho".

Olivetto focaliza outro aspecto: "Foi a partir daquele estouro que se solidificou o Jorge 'cult'". Abria-se, para o cantor, uma fase de inédita valorização da obra anterior. Mesmo sob desgaste, se consolidava, com uma geração de atraso, a compreensão da colossal originalidade de discos formadores da identidade musical brasileira, como Samba Esquema Novo (63), Força Bruta (70), Negro É Lindo (71), A Tábua de Esmeralda (74), África Brasil (76).

No ambiente musical, de Marisa Monte ao mangue bit, quase todos que então surgiam pediram a bênção, declararam influência, ocasionalmente clonaram o mestre. Na periferia paulistana, os Racionais MC's surgiram sob nenhuma identificação com a música brasileira, a não ser a de Tim Maia e Jorge Ben. "Mano Brown escreveu para mim, analisando A Tábua de Esmeralda, letra por letra. O que ele faz é bom, honesto. Alguém tem que prestar atenção no que fazem, nas letras deles."

Ao participar de um show dos Racionais no Sesc Itaquera, em 2004, conheceu os filhos de Brown, batizados em homenagem a ele e à esposa. "Fiquei emocionado quando conheci o Jorginho e a Domênica, naquele dia." Por causa dele também se chama Jorge o filho recém-nascido do músico Max de Castro, outro filho de Simonal e quase-filho de Ben Jor.

Diz Max: "Ele foi se mantendo em altos e baixos. Voltou, sumiu, voltou. Sobreviveu a modas e movimentos, sempre na paralela. Tocou no Beco, mas não era da elite da bossa nova. O mesmo com a jovem guarda, a tropicália, o samba-rock. Nos anos 90, até Chico Buarque começou a falar que Jorge Ben era demais. Foi uma redenção até para aquela geração, que teve esse descuido com ele".

"Ele foi muito machucado, muita gente o menosprezou após o sucesso de Mas Que Nada", concorda Simoninha.

"Durante muito tempo, foi um artista exilado no próprio país. Hoje mora em Miami, o que para mim é algo inaceitável", diz João Parahyba. Max aborda o tema sob outro registro: "Jorge mora em Orlando, num condomínio onde moram atores de Hollywood. Vem para o Brasil só para fazer show. Um cara que todo mundo achava que era um mané, um louco, é o grande pop star brasileiro".

O pop star volta à terra natal vez por outra, para cantar no Fasano ou prestigiar o lançamento de Recuerdos de Asunción 443, CD de raridades dos anos 80 que se encerra com uma única canção nova, Emo, em citação a uma das tribos roqueiras em voga, de adolescentes que adotam roupas pretas, maquiagens carregadas, rock pesado, mas emotivo, e muita melancolia. Parecem infelizes, mas são felizes/ (...) parecem ilegais, mas são legais, canta, ensaiando mais um deslocamento, o missionário de alegria, simpatia e balanço que, segundo alguns, nunca fez uma música triste.

Jorge desafia o clichê: "Eu sou um emo. Sou o tio emo". Ora diz que dedicou o disco a jovens emo que são seus vizinhos, ora dá a entender que, pai dos jovens Tomás e Gabriel, convive com o imaginário emo sob o mesmo teto: "Eu via isso lá em casa. Em cinco minutos alguém ficava bravo, depois ficava triste, depois alegre...".

João Parahyba belisca o assunto ao tecer impressões sobre o ex-parceiro: "Tenho a impressão de que se tornou um cara muito reservado, retraído, fechado, com medo do que os outros vão falar dele. Talvez hoje seja um artista triste. Talvez se sinta deslocado musicalmente, entre mundos". Inicialmente duro, o depoimento deságua em emocionada declaração: "Ainda gostaria de fazer um show com ele, ou uma música que seja, porque sempre gostei muito dele. Mas isso é a vida que vai realizar, ou não".

Ao final da entrevista, Jorge se descontrai. Fala sobre os cachorros. "Bota aí os quatro, senão vão ficar com ciúmes. Pumpkin e Spring são da raça lhasa apso. Aí tem uma maltês, a Tessy, e um poodle, Tuca Calvin". Fala sobre os filhos. "Não tem nenhum músico. Tomás se formou agora na Flórida, em business administration. Está mandando currículo, de férias, jogando golfe, que ele gosta muito (assim como o próprio Jorge). Gabriel está indeciso entre fazer (faz uma pausa, suspira) ciências políticas e jornalismo".

E ele, gosta de política? "Não, sou apolítico", responde o padrinho de um dos filhos de Roberto Carlos. "Faço meu dever cívico, dou meu voto, às vezes me arrependo." Tem se arrependido recentemente? "Agora, por enquanto, não. Pensei que ia me arrepender, mas não. Mas gostaria que o dólar voltasse a valer um real. Os empresários não gostam, mas é bom para o povo", divaga o criador de País Tropical, antes de partir rumo à madrugada.


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"carta capital" 446, de 30 de maio de 2007.

UMA NOVA TRILHA
Reformulada, a gravadora Som Livre não quer mais depender exclusivamente dos discos das novelas da Globo


POR PEDRO ALEXANDRE SANCHES

Uma fera adormecida dá sinais de acordar no terreno minado da indústria fonográfica brasileira. Ao longo das últimas duas décadas, a gravadora Som Livre se recolheu ao papel de braço musical coadjuvante da empresa-mãe, a Rede Globo. Desfez-se de um garboso elenco e se concentrou quase exclusivamente num jogo encenado em parceria com as gravadoras multinacionais, transformadas em fornecedoras de sucessos musicais para trilhas sonoras de novelas e outras compilações.

"Agora, na diretoria, é todo mundo de jeans e camiseta. É tudo DJ", alegra-se o músico Jorge Ben Jor, que integrou o elenco quando ainda se chamava Jorge Ben e está de volta à casa após 21 anos. "Eles tinham um cast (elenco) com músicas nas novelas, e de uma hora para outra demitiram todo mundo. Chamaram um por um, 'vocês estão liberados', só ficaram com as novelas e a Xuxa", lembra.

Ao falar de DJs de jeans e camiseta, Ben Jor se refere à nova geração que assumiu a Som Livre no final de 2004, após o afastamento de João Araújo, pai de Cazuza e desde os anos 60 um dos mais ativos chefes locais de gravadoras. São DJs profissionais o diretor artístico da nova Som Livre, André Werneck, de 40 anos, e o gerente de projetos especiais Marcus Vinícius Castro, 37 anos.

"Sou DJ há 17 anos. Já passei por todos os segmentos: festa de debutantes, de pessoas mais velhas, bodas. Hoje sou DJ de eletrônica, atuo no final de semana", explica Castro.

Não é o mesmo caso do atual presidente da companhia, Gustavo Horta Ramos, de 37 anos, ex-executivo da cervejaria Molson, da Cera Johnson e da L’Oreal. "Vim da área de produtos de consumo, que, afinal, também é o caso dos CDs e DVDs, enquanto ainda são produtos tangíveis", diz.

O histórico dos três revela a mudança de comportamento da Som Livre, mais evidente nas últimas semanas, enquanto a empresa joga no mercado discos inéditos de veteranos que andavam desgarrados das gravadoras, como Raimundo Fagner, Nana Caymmi, Renato Teixeira, Dadi (ex-integrante do grupo A Cor do Som), Lulu Santos, Guilherme Arantes. A novidade contrasta com os anos em que a gravadora se limitou a recolher fonogramas de artistas de outras gravadoras para veiculá-los maciçamente nas novelas e vendê-los reunidos em compilações.

"A queda do mercado no primeiro quadrimestre de 2007 foi muito mais dramática do que a gente esperava. Começamos a ver que é necessário ter conteúdo. Se a música for para celular e download, a função do compilador perde a razão de ser. Achamos que a compilação ainda durava, mas vimos que temos que testar bastante coisa, mais rápido", afirma o presidente.

A visão mercadológica não deixa de ser a mesma que assolou a indústria a partir dos anos 80, quando diretores ligados à música foram gradualmente substituídos por especialistas em marketing, egressos de quaisquer áreas.

Horta Ramos, porém, chega à conclusão óbvia que outros dirigentes de gravadoras hesitaram durante anos em aceitar: as novas tecnologias fazem estremecer os modelos de música tratada como item de prateleira supermercado, e obrigam a indústria a ir buscar no baú, ao menos para efeito de discurso, a palavra "conteúdo".

"As gravadoras caíram muito na mão de mauricinhos. Não dá, eu não seguro", queixa-se Fagner, antes de elogiar a casa nova, que abraçou o CD Fortaleza, após uma tentativa frustrada junto à Sony BMG: "Estou imbuído no projeto de fazer da Som Livre uma gravadora grande, como foram as outras, a minha casa. Estou vestindo a camisa. É muito melhor, a Sony BMG teria que gastar com o que ali já temos de graça".

Fagner se refere à vitrine divulgadora que é a tela da Rede Globo e à engrenagem que move em sincronia as diversas marcas do grupo. Horta Ramos comprova: "Nos interessam artistas com produtos de conceito editorial claro, que se explique em poucas palavras, simples de vender. Aí não dependo das rádios, consigo explicar via televisão, boto dentro da engrenagem, de tevê, rádio, jornal".

"Quando tem alguma coisa para dizer você precisa do veículo, para que as pessoas escutem. Você não quer saber a ideologia do piloto, só quer que ele leve você de lá para cá", diz o músico Renato Teixeira, compositor de sucessos de novelas como Romaria e Frete (da série Carga Pesada). Também publicitário, ele entregou à distribuição da Globo o projeto de "folk brasileiro" No Auditório Ibirapuera, em CD e DVD.

A mera tarefa compiladora norteou a ação da Som Livre, mas também viciou as demais gravadoras, até hoje atoladas na busca imediatista de lucro com intermináveis coletâneas, acústicos e retrospectivas ao vivo. Na tentativa de modificar o hábito, entram em ação os executivos-DJs.

"Buscamos algo diferenciado, não o varejão focado só em compilação e compilação e compilação. O objetivo é sair da imagem de gravadora dos oportunistas, que só colocam sucessos dos outros no mercado", define o gerente Castro, que descobriu, por exemplo, um reservatório de faixas perdidas de Ben Jor nos anos 80, e construiu o inédito Recuerdos de Asunción 443 (rua Assunção, 443, é o endereço carioca da Som Livre, agora abertamente exposto na capa de um CD).

As compilações oportunistas agora dividem prioridade com projetos como a reedição histórica dos discos de estréia de Elis Regina, Chico Buarque, Djavan e Raul Seixas e reedições de títulos importantes do acervo. A série mais recente, Grandes Vozes, reúne 15 coletâneas, mas desta vez de nomes do passado há muito ejetados das lojas, como Agostinho dos Santos, Nora Ney, Jorge Goulart, Leny Eversong, Dick Farney e outros.

Uma terceira ponta em que a gravadora se diz disposta a investir é o da renovação. O esforço mais reluzente deve ser o lançamento, em junho, do CD de estréia da Orquestra Imperial, grupo novo celebrado no Rio, mas menos conhecido no resto do Brasil. "Gustavo chegou à gente sem os cacoetes da indústria, de modo transparente. O que já foi um grande lobo mau se revelou um grande amigo", descreve Berna Ceppas, membro da Orquestra Imperial e dono do selo Ping Pong, que bancou a gravação do CD e o compartilhará com a máquina global.

Ceppas fala da inusitada associação entre "lobo" e "cordeiros": "Fizemos o disco do jeito que queríamos. Aí tínhamos que distribuir, e não éramos muito vitoriosos nisso. A Som Livre oferece um poder de sedução forte. Fizemos um contrato convencional de distribuição. Os comerciais da Globo não são um ativo da Som Livre, então essa parte não entra no contrato. É um apalavramento entre empresas irmãs".

O novo modelo, que suprime a cultura anterior de contratos milionários, vale para os iniciantes, mas também para os mais experientes. "Tenho um estúdio em Fortaleza, estava com os músicos lá e fui fazendo, durante um ano. Dei o CD pronto, eles lançam", conta Fagner. "Vivemos um baque enorme num mercado que era fabuloso. A gente fazia contratos malucos para cinco discos, ficava na obrigação. Muitas vezes era o desejo da gravadora, e o artista ia junto. Agora é mais uma relação de cumplicidade que de bajulação por causa de contrato".

Renato Teixeira vai na mesma direção: "Nos anos 50, quando eu ligava o rádio, ouvia Meu Mundo Caiu. Um dia tocou O Barquinho, olha que transformação absurda. Vi o Brasil sair da fossa e ir para o sol, de um dia para o outro. O que acontece agora no mundo do disco é um pouco isso, está saindo de uma coisa cinzenta, para uma coisa mais dinâmica e justa. Acho melhor assim, porque o controle está cada vez mais voltando para nossa mão".

Se uns encontram libertação nas fórmulas de parceria com a Som Livre, outros vivem ali a primeira experiência de se ancorar ao sistema fonográfico. É o caso da Banda Calypso, egressa da indústria musical informal do Pará e hoje o grupo que mais vende discos no País, até aqui sem apoio de nenhuma gravadora. Pois a Som Livre distribuirá o projeto 100%, ligado à Rádio Globo, uma compilação em CD e DVD de sucessos tecnobrega da Calypso.

A aproximação denota, por parte da Globo, uma antena conectada aos fenômenos informais que se desenvolvem às margens da indústria fonográfica, como o funk carioca (que já aparece em diversas coletâneas da Som Livre) e o tecnobrega paraense. "Se pagarem imposto, os discos desses grupos deixarão de ser apreendidos, terão visibilidade. É uma cooptação para o bem", crava Horta Ramos.

Outros projetos por vir se relacionam à música das diversas regiões do País, o que parece colocar a Som Livre em sinergia com conceitos das Organizações Globo, como a regionalização, o documento Conteúdo Brasil e a entrada no mercado cinematográfico, com a Globo Filmes. Faltava a música, eis ela aí.

Mas seria esse um projeto de tomada de poder, no combalido ambiente fonográfico? "Deus me livre", o presidente afasta de si esse cálice. "Não temos a menor fixação com market share (a participação de cada gravadora no mercado total). Mas temos com lucratividade, em primeiro lugar, e com relevância para a cultura, em segundo. A pré-condição é não perder dinheiro."